São Paulo, domingo, 19 de fevereiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES

Ao caro leitor, para sua meditação

O número é assustador: R$ 1,097 trilhão! O cálculo foi realizado pelo ex-ministro da Previdência Social, o professor José Cechin ("Um rombo trilionário", "O Globo", 13/2). Trata-se do déficit acumulado da Previdência Social referente à União, Estados e municípios. É um valor superior ao da dívida pública, que é de R$ 1,002 trilhão.
Os dois números dizem respeito a duas dívidas que precisam ser honradas: a primeira, com os aposentados, pensionistas e assistidos; a segunda, com os poupadores e detentores de títulos públicos.
A reforma previdenciária realizada em 2003 ajudou muito pouco. Os grandes desequilíbrios continuaram vivos e precisam ser eliminados. Dentre eles, destacam-se a necessidade de (1) fixar uma idade mínima progressiva para aposentadoria; (2) equalizar a aposentadoria de homens e mulheres, assim como de professores e demais trabalhadores; (3) equacionar o déficit causado pelos aposentados que nunca contribuíram para a Previdência Social (em especial os do meio rural); (4) ajustar os aumentos do salário mínimo às receitas da Previdência Social ou buscar um regime que evite os seus impactos negativos.
A correção desses desequilíbrios está por ser feita. É claro que isso envolve medidas impopulares. Mas é da responsabilidade do estadista garantir a proteção das gerações futuras. Do jeito que está, o sistema quebrará em pouco tempo, criando uma devastação social para os idosos, doentes e portadores de deficiência. Isso sim é impopular. Impopular e desumano. Algo inimaginável para uma nação que deseja continuar sendo respeitada no cenário mundial.
O Brasil gasta 13% do PIB com Previdência Social. As nações avançadas gastam 8% a 9%, tendo uma população mais velha do que a nossa. Os países emergentes gastam cerca de 5%, citando, como exemplo, não a Índia nem a China (que estão apenas formando o sistema de proteção aos idosos), mas a Coréia do Sul e o Chile, que gastam apenas o que arrecadam.
Esse brutal endividamento é nefasto para o crescimento econômico e progresso social. Para honrar os compromissos previdenciários, o governo tem de buscar recursos no mercado financeiro (o que eleva a taxa de juros), usar recursos do superávit primário (o que inibe os investimentos públicos) ou aumentar os impostos (o que desestimula os investimentos privados).
Tudo isso vai contra o crescimento e o progresso. Somando-se os dois meganúmeros -que ultrapassam a fantástica casa dos R$ 2 trilhões-, vê-se estar aí o principal gargalo do desenvolvimento anêmico do Brasil. É ridículo registrar que, com tantas potencialidades, nosso PIB é cerca de 1% do PIB mundial!
Neste ano de eleições, os candidatos evitarão falar sobre esses ajustes. Mas nós, eleitores, temos de cobrá-los. Afinal, é sua responsabilidade, como governantes, cuidar das contas públicas. Por isso, eles precisam dizer quais serão as medidas que tomarão para garantir o futuro das próximas gerações. É uma obrigação moral da qual não podem se furtar. Democracia é isso!


Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.
@ - antonio.ermirio@antonioermirio.com.br


Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: De idéias e dentes
Próximo Texto: Frases

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.