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CARLOS HEITOR CONY
Raciocínio perverso
RIO DE JANEIRO - Nas edições de ontem, não apenas da Folha mas também nas de alguns dos jornais mais
importantes do Brasil, não ficou pedra sobre pedra no edifício que o governo está construindo e que, na realidade, deveria ser uma desconstrução de tudo o que estava errado, de
tudo o que o PT durante anos combateu com tanto entusiasmo.
Não entendo de política nem de
economia, mas entendo um pouco
da desilusão e da desesperança, em
causa própria e coletiva. No que diz
respeito à política econômica e financeira, é inútil desculpar o governo pela amostragem dos primeiros
meses de poder. Em nome do senso
comum, concede-se que ainda não
houve tempo para as grandes reformas prometidas, como a agrária, a
fiscal, a previdenciária, a administrativa.
Mas o varejo permanece igual ao
do governo anterior, que também
frustou as esperanças depositadas
num intelectual de esquerda que, ao
longo de oito anos, se curvou e fez o
Brasil se curvar diante do capital e
da especulação financeira.
As razões apresentadas pelos gestores da nossa economia pretendem ser
uma desculpa, mas nem chegam a
ser razões nem podem ser aceitas como desculpa. Havia até maior coerência na política exercida pela turma de FHC e Malan: somente com
juros altos, altíssimos, a inflação seria controlada.
Um raciocínio perverso. O grande
trunfo apresentado pelo governo anterior foi o fim da inflação. Ora, se
não existe inflação, ou se ela está sob
controle estrutural pela formação de
uma cultura antiinflacionária, substituindo a outra, que era uma cultura inflacionária, a manutenção dos
juros é um contra-senso.
Isso no plano estritamente retórico.
No plano que conta, o da realidade
de nossa economia e da necessidade
de crescer para sobreviver, os juros
que aí estão conflitam com tudo o
que se esperava de um governo que
salvaria a nossa lavoura.
E, além de conflitar, anunciam dias
cada vez piores para as empresas que
trabalham e não especulam. E para
todos nós, que estamos pagando a
conta.
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