São Paulo, quarta-feira, 19 de julho de 2000


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CARLOS HEITOR CONY

Fidelidade ao Reich

RIO DE JANEIRO - Acredito sinceramente que o presidente da República não tenha lido o documento relativo às verbas do TRT paulista. Impossível o executivo de uma grande empresa ler tudo o que passa pelo seu expediente. Dizem que Getúlio o fazia -mas os tempos eram outros e menor a papelada oficial.
Apesar disso, sua responsabilidade no escândalo é inarredável. Preocupado em redesenhar o Estado, em citar Weber, Bobbio e outros intelectuais, ele desdenha a banalidade do expediente que lhe compete, transferindo os catataus para os homens de sua confiança.
E aí é que a sua situação se complica. Já teve um chefe de cerimonial que foi afastado por causa de um grosso escândalo, o do Sivam. Seu amigo mais chegado, o falecido Sérgio Motta, ministro todo-poderoso enquanto durou, foi citado nominalmente como provável corruptor de congressistas no caso da compra dos votos pela emenda da reeleição.
Outros homens de sua absoluta confiança também foram envolvidos no caso das teles, do Banco Central, não houve estouro na praça em que, direta ou indiretamente, não houvesse um dos varões que o presidente da República alçou ao primeiro escalão.
O presidente não leu o que assinou. Pediu que esquecessem o que escreveu antes de chegar ao poder. Sua leviandade pelo que assina ou escreve é espantosa. Não se pode acreditar que tenha alguma coisa a ver com as contas em Cayman. Em matéria de dinheiro, pessoalmente ele é honesto. Mesmo assim, fica a dúvida: e se ele abriu uma conta no exterior sem saber o que estava fazendo?
Um dia, disseram a Hitler que Goering havia roubado quadros de um museu de Paris, levando-os para seu museu particular. Hitler sorriu e comentou: ""Ele é fiel ao Reich, é fiel a mim!". Como os tempos também eram outros, nem precisou assinar nada.


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