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CARLOS HEITOR CONY
O rei e o povo
RIO DE JANEIRO - Aproxima-se a hora das grandes e das pequenas decisões que vão melhorar, piorar ou
manter na mesma a vida nacional.
Temos um presidente eleito que tem
a cara e a ginga do brasileiro comum,
sem diploma em Nanterre nem casa
com piscina em Miami. Mais terra a
terra seria impossível.
Terá agora pouco tempo, cada vez
menos tempo, para montar suas
equipes de primeiro e demais escalões
-e, embora a oferta de mão-de-obra
seja farta e até mesmo razoável em
termos de qualidade, as circunstâncias que cercarão o novo governo são
complicadas e de certo modo contraditórias.
Suponhamos que, interessado em
formar um ministério que a mídia
poderia classificar de alto nível, Lula
convide Brizola, Arraes e Itamar, numa homenagem óbvia à biografia de
cada um deles. Seria uma barretada
inútil, em termos de novidade administrativa.
Sempre que alguém chega ao poder,
lembro um dos últimos filmes de o
Gordo e o Magro. Depois de muitas
confusões, perigos, correrias, equívocos e uma boa dose de tortas pela cara, a dupla chega finalmente a uma
ilha onde serão os donos.
Diga-se que a ilha é deserta, nada
tem, nem mesmo habitantes. Isso não
importa: ele são os senhores daquele
pedaço de terra cercado de água por
todos os lados.
O Gordo, que sempre toma as iniciativas, por si e pelo companheiro,
olha a sua possessão com a autoridade de dono absoluto. Batendo no próprio peito, se proclama rei.
O Magro aprova, mesmo que não
aprovasse levaria sobras, mas quer
saber o que ele será naquele ilha em
que o amigo já é o rei.
O Gordo olha para o Magro e com o
fura-bolo no peito do amigo, declara:
"Você será o povo!"
Feita a divisão de poderes, não conseguem exercer os seus respectivos
ofícios. Surgem uns animais que expulsam o rei e o povo.
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