São Paulo, terça-feira, 19 de novembro de 2002 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES Fome Zero: bom nome, má idéia SÉRGIO FAUSTO
Fome Zero é um excelente nome
para um programa de combate à
subnutrição, problema secular que persiste no Brasil de hoje, ainda que em escala declinante. É sintético, forte, sonoro e de fácil compreensão quanto ao seu
objetivo. Ao denominá-lo assim, o PT
mostra estar atento à necessidade de
criar marcas que o identifiquem e o diferenciem.
Seguramente, grande parte dos brasileiros que sofrem de carência alimentar está assistida por esses programas. Todavia não é possível responder hoje, com um grau razoável de certeza, quantos não estão e quantos estão e permanecem, ainda assim, subnutridos. São questões cruciais para quem se propõe a adotar a subnutrição como foco central das políticas assistenciais de combate à pobreza. Para respondê-las, não seria necessário partir da estaca zero, uma vez que já se iniciou a formação do cadastro único da rede de proteção social. Além disso, existe conhecimento acumulado nas universidades e instituições de pesquisa sobre a distribuição social e geográfica da desnutrição. O PT, porém, preferiu até aqui o simbolismo forte do Fome Zero. Ocorre que o simbolismo, neste caso, provoca retrocesso. A ressurreição dos cupons de alimentação recriaria o espaço de intermediação política suprimido ou minimizado pelos programas existentes. O Fome Zero pagaria, assim, um tributo indevido e desnecessário ao Brasil arcaico. Um tributo não apenas em sentido metafórico, mas quase literal, pelo que implicaria em termos de má focalização e desperdício de recursos públicos escassos. Ainda que os defeitos operacionais mais óbvios sejam solucionados, restaria uma questão a examinar. Dadas as restrições fiscais conhecidas e que não serão menores no curto e no médio prazo, a implantação do Fome Zero acarretaria uma de duas situações possíveis: ou bem o programa ficaria muito aquém dos objetivos anunciados, ou limitaria a expansão de programas sociais que estão a ganhar fôlego, entre eles o Bolsa-Escola e o Bolsa-Alimentação, que cobrem o ciclo crítico de formação física, psicológica e educacional da pessoa e dirigem-se à faixa etária em que maior é a concentração da pobreza no Brasil. Fica a pergunta: não seria socialmente mais eficaz, inclusive para atacar a subnutrição, concentrar os recursos disponíveis na ampliação desses programas? Afinal, como disse o presidente eleito durante a campanha, programas governamentais não têm dono. Se dão certo, é bom para todo mundo. Sérgio Fausto, 40, cientista político, é assessor da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda. Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Dom Mauro Morelli: Fome é problema político Próximo Texto: Painel do leitor Índice |
|