São Paulo, sábado, 20 de janeiro de 2007

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O Supersimples prejudica o Sistema S?

SIM

Mutilação anunciada

ABRAM SZAJMAN

EM 1945, o mundo emergia da Segunda Guerra Mundial com a esperança de construir instituições que garantissem não apenas a paz duradoura entre as nações mas também a estabilidade econômica e social no interior de cada país.
No Brasil, a criação do chamado Sistema S estabeleceu uma base para o exercício da responsabilidade social dos empregadores seis décadas antes de esse conceito entrar para o cotidiano das empresas e das pessoas com o significado atual: o de suprir as lacunas do Estado na área social, ajudando a preservar as conquistas da civilização ante o avanço da barbárie.
A Folha me pergunta se o Supersimples prejudica o sistema. A resposta é sim, sem sombra de dúvida. O Sesc e o Senac -mantidos pelos empresários do setor do comércio e serviços, em que predominam as empresas de pequeno porte- terão redução de receita da ordem de 20%, e, para o Sesi e o Senai, a perda será de 10%, segundo projeções das entidades.
Em conseqüência, coloca-se sob ameaça um benefício conquistado pelos trabalhadores e a expansão física das unidades educacionais, culturais e desportivas para áreas carentes, bem como a quantidade e a abrangência dos programas atualmente executados, próprios ou em parceria.
Apenas em relação ao Sesc e ao governo federal, há ações conjuntas com sete ministérios, inclusive para o combate à fome. Com o Senac, desenvolvem-se programas -como Alimentos Seguros, Soldado Cidadão, Menor Aprendiz e Regionalização do Turismo- que serão afetados.
As minudências jurídicas que têm sido destacadas apenas tangenciam o problema. Sobre esse aspecto, convém lembrar que os constituintes de 1988, atendendo a uma vontade popular expressa em imensas listas de assinaturas de apoio, consagraram no artigo 240 da Constituição as contribuições de todos os empregadores para manter o Sistema S.
O antigo Simples não alterou esse dispositivo. Foi a Receita Federal, por meio de atos infralegais, que considerou as empresas inscritas nesse sistema "isentas" da contribuição, entendimento já refutado por insofismável sentença judicial. Se, por causa disso, algumas empresas deixaram de contribuir, nenhuma deixou de ser contribuinte, o que agora ocorrerá, quando o Supersimples entrar em vigor.
Fica claro, assim, que a questão é política. Desonerar a produção e simplificar a tributação, principalmente para as micro e pequenas empresas, são fatores hoje tão cruciais para o país que a Fecomercio-SP desenvolveu, ao longo de 2006, o projeto Simplificando o Brasil, com propostas que contemplam -e vão além- o obtido com o Supersimples. Nesse aspecto não precisamos, nem aceitamos, de lições de ninguém.
A modernidade empresarial, porém, não pode ser obtida à custa do retrocesso social. Pelos ralos do desperdício da inchada máquina estatal, em todos os níveis, continuarão a escorrer os tributos pagos pelas pequenas empresas. Somente as instituições privadas de serviço social e formação profissional foram atingidas pela ação ou omissão de alguns políticos que, nas tribunas e palanques eleitorais, fazem juras de apoio ao trabalho dessas entidades.
É nosso dever alertar o presidente Lula para a espada que paira sobre o Sistema S, com data marcada para iniciar a mutilação. Afinal, é de sua autoria a frase: "Só critica o Sistema S quem nunca precisou dele". Além disso, foi um curso de torneiro mecânico do Senai que abriu as portas da história para um operário tornar-se presidente do Brasil.
Será fundamental, nos próximos meses, que Executivo e Legislativo encontrem, em consonância com a sociedade, uma alternativa para atenuar ou evitar o dano anunciado. O Sesc e o Senac, cujo trabalho sociocultural e educacional é nacional e internacionalmente reconhecido, não podem e não devem ser afetados. A menos que se queira manter a juventude das grandes cidades, por falta de alternativas, como exército de reserva do crime organizado.


ABRAM SZAJMAN, 67, empresário, é presidente da Fecomercio-SP (Federação do Comércio do Estado de São Paulo) e dos conselhos regionais do Sesc e do Senac.

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