UOL




São Paulo, terça-feira, 20 de maio de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LOUCURA E SANIDADE

A boa notícia é a de que os pacientes psiquiátricos estão deixando os manicômios. A má diz respeito à morosidade com que isso ocorre. Com efeito, em 2001, ano em que foi aprovada a lei da reforma psiquiátrica, havia no país 56.755 leitos destinados a doentes mentais; hoje, há 54.946 vagas. Em dois anos fecharam-se, portanto, 1.809 leitos. As internações psiquiátricas, que eram 394.899 em 2000, caíram para 280.504 em 2002.
Moléstias psiquiátricas, como é óbvio, não se extinguem por decretos legislativos. A contrapartida ao fechamento dos hospícios é a criação de serviços de saúde mental extra-hospitalares, como os CAPs (Centros de Atenção Psicossocial) e os ambulatórios de álcool e drogas. Em 1997, havia no país 176 serviços alternativos; hoje eles são 424.
Embora algumas escolas médicas ainda defendam a existência de hospitais específicos para pacientes psiquiátricos, é praticamente um consenso o de que o doente mental deve, na medida de suas possibilidades, ser reintegrado à sociedade. A internação deve ser reservada para casos agudos e limitar-se ao menor período de tempo possível. O tratamento propriamente dito deve ser oferecido em nível ambulatorial.
A lei dos direitos dos portadores de transtornos mentais, de 2001, que substituiu uma legislação cujo corpo datava essencialmente de 1934, representou um inegável avanço no campo da cidadania. Infelizmente, porém, ela ainda incorre em arcaísmos autoritários de discutível constitucionalidade como a previsão de internação involuntária a critério médico. A Lei Maior diz que um civil só pode ser privado de sua liberdade na ocorrência de flagrante delito ou mediante ordem judicial. Curiosamente, esse princípio básico da Constituição não vale para aqueles sobre os quais pesa a suspeita de insanidade.
É interessante, a esse respeito, a reflexão do filósofo Miguel de Unamuno: "Cada um tem seu método, como cada um tem sua loucura; apenas, estimamos sensato aquele cuja loucura coincide com a da maioria".


Texto Anterior: Editoriais: ATENTADOS À PAZ
Próximo Texto: São Paulo - Clóvis Rossi: Eles não sabem o que fazer
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.