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São Paulo, sexta-feira, 20 de junho de 2003

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REPÚBLICA DA PIZZA

Um dos homens mais ricos de um país do Primeiro Mundo é também seu dirigente. Pesam contra ele gravíssimas acusações, que incluem lavagem de dinheiro, cumplicidade em assassinato, conexões com a Máfia, evasão de impostos e corrupção. Para evitar, porém, que o líder sofra uma condenação num momento em que ele estará em grande evidência mundial, seus aliados no Parlamento aprovam a toque de caixa uma lei que lhe confere imunidade, ainda que provisória.
Se isso tivesse acontecido num país de Terceiro Mundo como o Brasil, o rótulo "república de bananas" lhe seria impiedosamente pespegado. Como a nação onde se deram esses extraordinários acontecimentos é rica e faz parte do Primeiro Mundo, recebe um tratamento bem mais tolerante por parte da comunidade e da mídia internacionais.
Só que essa interpretação mais branda não é capaz de apagar o caráter escandaloso do casuísmo que o Parlamento italiano aprovou para proteger o primeiro-ministro Silvio Berlusconi, que também acumula o posto de magnata da mídia local.
Seria por certo um exagero afirmar que, com a aprovação da imunidade para Berlusconi, a Itália deixa de ser um país democrático, mas, por outro lado, parece evidente que as instituições locais, em especial a Justiça, saem abaladas do episódio.
Essa não é a única contradição envolvendo o governo de Berlusconi. Como cidadão, ele é dono de fato -recentemente, transferiu a propriedade de alguns de seus negócios a familiares- de vários jornais e de três emissoras de TV. Como chefe de governo, comanda as emissoras públicas. Isso basta para lhe dar o controle de pelo menos 90% das TVs do país. A pergunta que fica é se, sob essas condições, resta espaço para a legítima crítica, um dos pilares da democracia. O fenômeno Berlusconi revela que a riqueza material não é garantia de instituições sólidas ou escolhas políticas sábias. Isso não deixa de ser um consolo para o Brasil.


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