São Paulo, sábado, 20 de julho de 2002

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Ao reduzir a taxa de juros, a motivação do BC foi exclusivamente política?

SIM

Viés político

PAULO PEREIRA DA SILVA

A decisão do Copom, anunciada na última quarta-feira, de baixar os juros de 18,5% para 18%, foi, sim, eleitoreira. A decisão nos causa muita estranheza. Não há dúvida de que o corte na taxa Selic foi uma interferência política na economia. A taxa já podia ter sido baixada havia pelo menos dois meses, em situação de risco menor e sem consequências para a estabilidade econômica. Como de praxe, a equipe econômica preferiu manter a taxa alta.
Vale lembrar que já nas últimas duas reuniões do Copom, ocorridas nos meses de maio e junho, tínhamos o seguinte cenário: redução da taxa de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) de 2,5% para 2%, decréscimo da massa salarial e decréscimo da meta de inflação nos últimos 12 meses. Diante de tal quadro, não havia mesmo razão teórica para manter a taxa de juros naqueles patamares, mas mesmo assim a equipe econômica preferiu mantê-la em 18,5%.
Foi muito estranha, portanto, esta redução de 0,5% na taxa de juros um dia depois de pesquisa do Ibope apontar o candidato da Frente Trabalhista, Ciro Gomes, isolado em segundo lugar na disputa eleitoral.
Fica evidente que a injeção de ânimo que o Banco Central pretendia dar na economia, na verdade, tem outra veia certa: fortalecer o candidato do governo, que vem perdendo força, e, consequentemente, aliados. A queda da taxa de juros criaria um efeito psicológico, causando a confusa sensação de melhora nas condições de vida da população brasileira.
O efeito da queda só será sentido, afirmam especialistas, daqui a seis meses. Portanto essa seria apenas a criação de um fator positivo para ser anunciado pela equipe econômica, que prefere atender interesses eleitoreiros em prejuízo dos interesses do país. Alerto ainda que a decisão não resultará em alterações radicais no comportamento da economia.
A medida é, de certa forma, inócua, pois as taxas de juros reais, adotadas pela chamada economia real, continuam elevadas, desestimulando o consumo e o crédito. Bancos e financeiras chegam a cobrar 160% de juros ao ano. Uma das maiores taxas do mundo, penalizando quem precisa de crédito. Assim, entramos no terrível círculo vicioso de geração de miséria. As indústrias têm dificuldades para cumprir seus compromissos e cortam a folha de pagamentos. O trabalhador sem salário não tem poder aquisitivo para consumir o que é produzido, o que impede o necessário giro de capital.
Sabemos -e há tempos temos cobrado o governo- que a economia brasileira não suporta mais os juros nesses atuais patamares. A política de juros altos tem sido nociva ao país. O custo social é muito elevado, com forte desaquecimento econômico e desemprego assustador. É em razão dessa política econômica equivocada e excludente que as micro e pequenas empresas não conseguem capital para crescer e, consequentemente, abrir novos postos de trabalho. É essa política de juros altos que alimenta o monstro do desemprego, que martiriza cerca de 11,5 milhões de trabalhadores brasileiros. Só na região metropolitana de São Paulo, um em cada cinco trabalhadores está sem emprego.
Essa política recessiva, que põe o país à mercê dos especuladores, resulta na miséria da população. Todos os dias, 33 milhões de pessoas ficam sem comida, porque não têm nada para se alimentar. É por isso que queremos mudar os rumos deste país. Precisamos baixar a taxa de juros e acabar com essa injusta distribuição de renda.
Gostaria de ressaltar que a proposta da Frente Trabalhista será de respeito à ampla autonomia operacional do Banco Central, sem deixar que se perca o princípio da responsabilidade política. Não vamos permitir que o BC sirva à primazia dos interesses financeiros em detrimento dos interesses produtivos. Vamos rever o sistema de "metas inflacionárias", para assegurar que o compromisso com o crescimento esteja aliado à estabilidade da moeda.
Deixo aqui uma pergunta: Será que os trabalhadores querem a continuação dessa política recessiva, voltada apenas para os bolsos dos especuladores, ou queremos a instabilidade com crescimento econômico, emprego e melhores salários?


Paulo Pereira da Silva, 46, presidente licenciado da Força Sindical, é candidato a vice-presidente da República na chapa de Ciro Gomes, da Frente Trabalhista.



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