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LUIZ FERNANDO VIANNA
Divina e cruel
RIO DE JANEIRO - Elizeth Cardoso
gira no toca-CD sem parar, e a cara-metade não resiste à incorreção política: "Como é que essas cantorinhas de hoje ouvem isso e pensam
que podem ficar gravando por aí?".
A crueldade é momentânea, um
lapso. Melhor absorver a delicadeza de Chico Buarque e entender Elizeth como a "mãe de todas as cantoras do Brasil". A definição está no
encarte do último disco da Divina,
"Todo o Sentimento", que ela não
pôde ver lançado por causa do câncer que a matou em 1990.
Hoje, às 19h30, o Instituto Moreira Salles realiza no Rio homenagem
aos 90 anos de Elizeth, completados na última sexta-feira. Ao lado
do violonista Bilinho Teixeira, Áurea Martins cantará "Meiga Presença", "Canção de Amor", "Barracão"
e outras que a amiga eternizou.
A apresentação é uma janela
aberta para um relacionamento
que se tornará público em 2011. A
instituição concluirá até o próximo
ano a catalogação do acervo da
cantora, com cerca de 360 "suportes sonoros" (fitas, LPs, CDs), 1.400
fotografias e 450 documentos (manuscritos, agendas, cartas etc.). A
consulta será possível por internet.
Entre as preciosidades do acervo
está o primeiro show dela no Canecão, em 1971, inédito em disco. Ela é
acompanhada de orquestra, coro e
ainda narra passagens de sua vida,
como quando era uma dancing girl
de poucos clientes.
Amores teve muitos. No final da
vida, lamentava ao amigo Herminio Bello de Carvalho que a sorte já
não fosse a mesma: "Não tenho
nem quem me mande à merda".
No encerramento do show do Canecão, Elizeth agradecia a todos.
"Obrigado até a você, Ary Valdez,
meu marido", alusão sarcástica e
doída a alguém que morrera dez
anos antes e de quem ela estava separada havia três décadas. Em seguida, cantava um trechinho de
"Apesar de você".
A crueldade de Elizeth não era
momentânea.
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