São Paulo, domingo, 21 de julho de 2002

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CLÓVIS ROSSI

A multidão

SÃO PAULO - Habituado a uma certa
solidão, começo a ficar incomodado com a multidão que começa a fazer críticas às deficiências ou do capitalismo "latu sensu", ou ao menos de sua versão contemporânea, com forte hegemonia do lado financeiro.
Nesta semana, David Ignatius, instigante colunista do jornal "The International Herald Tribune", uma das raras publicações a que se pode de fato chamar de global, comenta que o ioiô em que se transformou o mercado de ações nos Estados Unidos faz com que "os americanos talvez tenham uma melhor noção do que é sentir-se como um argentino, um tailandês ou um turco -e percebam que seu modo de vida econômico está à mercê de mercados financeiros caprichosos e de capitalistas mentirosos, que praticam o compadrio".
Em "The New York Times", Kevin Phillips, autor de "Riqueza e Democracia: uma História Política dos Ricos Americanos", lamenta os "excessos intelectuais de adoração do mercado, de laissez-faire e de darwinismo social. Noções de comunidade, propósito cívico e justiça foram postas de lado no debate público".
De passagem, Phillips insinua que o predomínio do setor financeiro pode ter raízes promíscuas na medida em que "se tornou o maior doador para eleições federais e o que mais gasta em lobbies em Washington" (no Brasil seria diferente?).
Sejam bem-vindos ao clube, mas convenhamos que esses pecados, capitais ou veniais, estavam evidentes desde a primeira hora.
Não era preciso, pois, chegar ao grau de destruição provocado pelas sucessivas crises financeiras regionais ou globais para sentir-se como um argentino, turco ou tailandês.
Mais importante: falta quem coloque de pé propostas de fato consistentes e mais ou menos consensuais para ao menos reduzir a predominância dos caprichos do mercado. É hora, não?



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