São Paulo, sábado, 21 de agosto de 2004

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FERNANDO RODRIGUES

Transparência zero

BRASÍLIA - Ao sancionar a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), Lula vetou o acesso de deputados e senadores ao Siafi. Logo depois, editou um decreto dando de volta esse privilégio mixuruca. É pouco ou quase nada na direção da transparência.
O Siafi é o Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal. Ali é possível saber quantas garrafas de água tônica ou quantos roupões de algodão egípcio são comprados pelo Planalto.
Só congressistas têm acesso total ao Siafi. Se um dos 179,4 milhões de brasileiros deseja consultar o sistema, precisa mendigar a um deputado ou senador. É degradante.
O episódio exemplifica à perfeição a distância entre o que a administração Lula promete em público e o que tem feito na prática. Em janeiro de 2003, o ministro Waldir Pires, da Controladoria Geral, declarou o seguinte: "Quero abrir o Siafi para que todos os cidadãos tenham acesso. Quero também a ampla publicidade dos balanços e relatórios periódicos da administração pública. Sempre de forma inteligível a todos".
Waldir Pires está certo. Deveria protestar contra outros vetos que Lula impôs ao sancionar a LDO. Por exemplo, foi vetada a obrigatoriedade para o governo explicitar "os parâmetros esperados" para o "nível de endividamento e volume de desembolso com serviço da dívida".
Lula também ficou invocado com a expressão "acesso irrestrito" a dados sobre Orçamento, Previdência e arrecadação. Vetou-a. Eis a justificativa: "[A] divulgação pode perturbar desnecessariamente o ambiente político e econômico do país, sem nenhuma vantagem aparente". Fantástico.
O governo Lula tem alguns defeitos, menos o da incoerência. Primeiro, propôs uma lei que visa "orientar, disciplinar e fiscalizar" a atividade de jornalismo. Agora, decide quais informações sobre seus gastos podem "perturbar desnecessariamente o ambiente" -como se já não fosse perturbada ao máximo a mente capaz de produzir raciocínio com tanto desapreço pela transparência.


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