São Paulo, Sábado, 21 de Agosto de 1999
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O segundo massacre

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Vamos deixar de leguleios jurídicos e fazer a pergunta certa: alguém aí acha que, se 19 PMs tivessem sido massacrados pelos sem-terra, algum dos criminosos teria escapado de uma condenação?
Mais provavelmente nem seriam levados a julgamento; teriam sido todos executados no próprio local dos fatos. Foi, aliás, o que aconteceu mesmo sem que um só PM tivesse sofrido mais que escoriações.
Os laudos sobre as execuções dos sem-terra, a seu devido tempo resgatados pela reportagem desta Folha, não deixam a menor dúvida sobre o que aconteceu em Eldorado do Carajás: a execução sumária de sem-terra. A menos que Deus, em um momento de suprema ira, tivesse sido o responsável, é óbvio que há culpados e que os culpados só podem ser encontrados entre os policiais.
Pode-se até não chegar a culpados individualizados. Mas, nessa hipótese, mais que em qualquer outra, o responsável é o chefe imediato da operação, seguido pelos comandantes da corporação e, em última instância, pelo chefe dos comandantes, ou seja, o governador do Estado.
Em corporações hierarquizadas, como é o caso da PM, não há outra maneira de distribuir culpas, a menos que se queira convidar à barbárie.
Em países minimamente civilizados, o que está longe de ser o caso do Brasil, as punições, pelo menos administrativas, teriam até precedido o julgamento pela Justiça, sempre mais demorado (e, no Brasil, mais demorado do que qualquer padrão civilizatório mandaria impor).
Bastaria rever os laudos, ou até mesmo o videoteipe dos acontecimentos, para que as autoridades punissem os culpados pelo massacre. Eram por demais evidentes, incriminatórios, selvagens mesmo.
No Brasil, no entanto, as evidências só pesam quando os acusados não têm amparo algum.


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