São Paulo, quinta-feira, 22 de abril de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

Dom Jorge Marcos

RIO DE JANEIRO - Uma ida a Santo André, na semana passada, deu-me um momento bom e triste ao mesmo tempo. Esperando a hora de fazer uma palestra na Casa da Palavra local, visitei a igreja ao lado sem saber exatamente o que procurava num templo que não chega a ser belo, mas tem a dignidade sombria que se espera encontrar nas casas de recolhimento e prece.
Pensava num amigo, colega meu, ele em fim de curso, eu iniciando-me no "rosa, rosae" do latim que se ensinava nos seminários antigos. Jorge Marcos de Oliveira ordenou-se e, de colega, passou a ser mestre. Com apenas três anos de sacerdócio, foi eleito bispo, inicialmente coadjutor aqui no Rio, mais tarde primeiro bispo de Santo André.
Foi o precursor de uma igreja anterior ao próprio Concílio Vaticano 2º, anterior até mesmo a João 23. Sua ida para Santo André, no centro de comunidades operárias, foi a semente que criaria um novo tipo de pastoral. Dom Hélder, por exemplo, que o sucedeu aqui no Rio, como auxiliar de dom Jayme Câmara, sucedeu-o também na luta pela justiça social.
E, de repente, enquanto pensava em Jorge Marcos de Oliveira, aos pés do altar dedicado a são José, encontrei a lápide com o nome de "Dom Jorge Marcos de Oliveira, primeiro bispo de Santo André".
Ali estava enterrado o nosso "Turcão", o aluno mais brilhante do seminário, depois o professor mais respeitado por todos nós. Gostávamos de brincar com ele, cantando um hino em sua homenagem: "Um dia desses fui ao quarto do Turcão, encontrei tudo no chão, ele morto de estudar, nem sabia mais rezar".
Faz anos que não me ajoelho diante de nenhum altar. Mas ali estava um amigo, que me deu o primeiro charuto Suerdiek -no dia em que saí do seminário- e me aconselhou a evitar o cigarro: "Procure sempre as coisas que valem a pena".


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