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São Paulo, domingo, 22 de junho de 2003

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CARLOS HEITOR CONY

O jogo da direita

RIO DE JANEIRO - Apesar de admirar o Zé Genoino, pelo seu passado e pelo seu presente, lamento que ele tenha embarcado numa canoa furada ao declarar, como presidente do PT, que as críticas ao atual governo "fazem o jogo da direita".
A pisada na bola começa pela satanização da direita, como se ela fosse a responsável por tudo de ruim que existe no mundo e na vida -pela fome, pela peste, pela guerra. E pela sacralização da esquerda, a vestal da história, contra a qual somente os ímpios, os criminosos, os torturadores e os ladrões se insurgem.
A coisa não é bem assim. Senti esse tipo de censura na própria carne durante os anos mais duros do regime militar, quando criticava a União Soviética, emblema e paraíso do socialismo. Deveria louvar permanentemente as forças do Pacto de Varsóvia que zelavam pela ortodoxia de Moscou, fazendo seus tanques rolar pelas ruas de Praga. Deveria louvar as clínicas psiquiátricas para os dissidentes e tudo o que também rolava nos porões da KGB, em atividade igual a dos porões onde milhares de brasileiros sofreram nas celas do DOI-Codi.
A melhor maneira de defender o governo, sobretudo para a militância tradicional do PT, é cobrar o programa partidário, o elenco de prioridades e de ações que botaram Lula na presidência da República. Há petistas acusados de serem radicais, mas cujo erro é exatamente continuarem sendo petistas, com tudo de certo e de errado que há tanto no PT como em qualquer outro partido.
Poupar o governo em nome da estabilidade e do clima de euforia pós-eleição de 2002 é continuar jogando errado em termos de história, que caminha sem dar bola para o sovado maniqueísmo de esquerda e direita. Tal como todos nós, que usamos as duas pernas para caminhar, sobretudo quando pretendemos ir para a frente.
A comparação é primária, mas a civilização é uma casca, um verniz que nunca escondeu o primata que somos todos.



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