São Paulo, segunda-feira, 22 de julho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS/DEBATES

Por onde começar?

HELOÍSA HELENA DE OLIVEIRA


Atuar no social não é tarefa simples, e a boa vontade não é suficiente para garantir uma atuação séria


Vivemos em um país de contrastes, onde riqueza e miséria são vizinhas, onde os problemas sociais se acumulam e se agravam, castigando, cada vez mais, uma sociedade já bastante sacrificada. Está claro que o governo só não dá conta de resolver e equacionar tais problemas ou reverter esse quadro. O público, sabemos agora, é de interesse e responsabilidade de todos nós.
Essa certeza vem gerando uma crescente conscientização de empresas e instituições quanto à importância de sua participação no resgate da cidadania e da dignidade social. Não se trata apenas de uma ação de marketing, mas sim de responsabilidade social, tema que tem pautado discussões empresariais e merecido atenção da mídia.
Mas atuar no social não é tarefa simples, e a boa vontade, embora indispensável, não é suficiente para garantir uma atuação séria. É preciso planejamento. É necessário primeiro definir em que causa atuar e o que fazer, ou seja, qual é a melhor contribuição que podemos dar? É verdade que todas as causas e problemas são importantes e nenhum deve ser desconsiderado, mas qualquer intervenção depende da natureza e das habilidades do agente social. É o primeiro passo para que sua ação faça diferença. Foi assim que deparamos com a inclusão social dos portadores de deficiência.
Ao analisarmos o que poderíamos fazer para contribuir com essa causa, percebemos que algumas perguntas permanecem sem resposta, seja pela inexistência de dados, seja pela abundância deles, às vezes contraditórios. O universo do portador de deficiência ainda é desconhecido por nós. Somente agora, com a divulgação da tabulação avançada do Censo 2000 pelo IBGE, concluiu-se que somos 24,5 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência, número dez vezes maior que o divulgado pelo Censo 1991. Diferentemente também do que se previa, não é a deficiência mental que predomina nesse universo, mas a visual, que acomete mais de 12 milhões de pessoas.
Os dados do Censo 2000, apesar de darem uma primeira idéia dessa realidade, no entanto, ainda não são suficientes para que tenhamos condições de tratar o assunto com assertividade. Só poderemos contribuir para uma inclusão real de pessoas quando as conhecermos melhor. É preciso saber mais. Onde estão essas pessoas? Que tipo de formação têm? Que habilidades podem ser potencializadas? Que necessidades têm?
E tantas outras questões sobre saúde, educação, esporte e lazer, capacidades, dificuldades, anseios e sonhos. Só assim o portador de deficiência deixará de ser parte de um número, de uma cota estabelecida.
Assim nasceu o programa Diversidade, que começa com um estudo, já em andamento, coordenado pelo professor Marcelo Néri, chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas, cujo objetivo é possibilitar um maior conhecimento do universo do portador de deficiência. O estudo foi planejado sob dois aspectos: estatístico, para dimensionar e qualificar esse universo por meio da análise dos dados existentes e o cruzamento dessas informações, e bibliográfico, um levantamento do conhecimento acadêmico sobre o assunto, produzido a partir de 1990.
O resultado que esperamos obter, previsto para daqui a nove meses, é um retrato da deficiência no Brasil, capaz de subsidiar ações, públicas ou privadas, voltadas para as pessoas portadoras de deficiência.
Este é o começo de um trabalho, que terá outras ações e desdobramentos, como o fortalecimento dos Conselhos de Direito, importantes fóruns participativos da pessoa portadora de deficiência; campanhas educativas, desvinculando deficiência de incapacidade; um guia sobre deficiência, disseminando serviços e informações sobre saúde, educação, legislação, orientação familiar e acessibilidade.


Heloísa Helena Silva de Oliveira, 46, economista, é presidente da Fundação Banco do Brasil.


Texto Anterior:
TENDÊNCIAS/DEBATES
Jorge da Cunha Lima: O naufrágio da ética

Próximo Texto: Painel do Leitor
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.