São Paulo, segunda-feira, 23 de agosto de 2004

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VINICIUS TORRES FREIRE

Olímpicas

SÃO PAULO - 1. Na TV, família e amigos de Robert Scheidt comemoravam no Brasil a medalha de ouro do grande velejador. Uma garrafa e taças de um vinho espumante claro, talvez champanhe, em algumas mãos. Lembrei da mãe do Romário, na Copa de 94, que festejava os gols do filho estilhaçando uns cascos de cerveja no quintal da casa pobre.
2. O futebol do Brasil não vai bem em Olimpíada. Parecemos nos reservar para a Copa, a festa nacional de fato do país. Gostamos do esporte em que os pobres têm mais chances, em que mais o improviso e o aleatório têm importância. Talvez gostemos tanto de futebol ainda porque a seleção passou a ganhar Copas quando o país criava para si uma identidade nacional e se imaginava, enfim e fugazmente, um lugar em que algo poderia prestar e dar certo.
3. Brasileiros ganham mais medalhas em esportes praticados ou difundidos por imigrantes em parte da classe média (o judô dos "japaulistas", a vela dos imigrantes nórdicos). Os pobres ganham algumas no atletismo que lhes sobra, mas não têm saúde ou condições materiais para mais. A classe média-alta, que teria acesso a meios de fazer esporte, não gosta nem tem o hábito do sacrifício competitivo (não precisam competir muito neste país elitizado).
4. Esporte é geopolítica. Ganha mais medalha quem tem tamanho, dinheiro e sede de poder, EUA e China na frente e a sempre emergente turma do oceano Pacífico a seguir.
5. Esportes em que nos damos bem não estão na Olimpíada. Somos da bola grande: futebol de grama, areia e salão, vôlei, basquete, vôlei de praia. Quantas medalhas haveria aí. Cada país, afora os grandões do esporte, faz política a fim de ter sua cota de modalidades para ganhar algo e viver euforias nacionalistas. O Brasil ainda não tem a sua cota.
6. Esporte é saúde massificada. Muita gente praticando para que se descubram os fenômenos genéticos e psicológicos que são os campeões.
7. Esporte é mercado. Precisa de empresas ricas para dar dinheiro aos atletas-garotos-propaganda.
Afora pela doença talvez inata do nacionalismo, não faz diferença ganhar medalhas. Mas país que ganha medalhas fez a diferença.


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