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CLÓVIS ROSSI
Apenas um ser humano
SÃO PAULO - Quando era correspondente da Folha na Argentina, havia
um programa humorístico na TV
chamado "Semanário Insólito".
Um dos quadros consistia em mandar um falso repórter às ruas para fazer as perguntas mais estapafúrdias
(esquema que deve ter sido copiado
de outro país).
Perguntas do tipo: "O que o sr. acha
das chances de Menem no segundo
turno contra Lula?".
Não havia um santo capaz de dizer
que Menem e Lula jamais poderiam
estar juntos no primeiro, no segundo
ou no terceiro turno. Ao contrário,
sempre havia respostas brilhantes,
delírio à parte.
Nesta campanha eleitoral, o "Semanário Insólito" me veio à cabeça
uma e outra vez, mais do que em eleições anteriores. Não há um só candidato (ao governo do Estado ou à Presidência da República) capaz de admitir o óbvio: é impossível dominar
todos os assuntos, da taxa de juros à
segurança pública, da transposição
do rio São Francisco à Alca, da saúde
à ciência e à tecnologia.
Cria-se, portanto, uma farsa em
cumplicidade com o eleitor. Eles fingem que sabem tudo sobre tudo e a
gente finge que acredita que eles de
fato sabem.
Fico com a enorme curiosidade de
saber que efeito teria no eleitorado se
Lula respondesse assim à "pegadinha" de Anthony Garotinho no debate final na Rede Globo sobre a tal
Cide (Contribuição sobre Intervenção no Domínio Econômico): "Veja
bem, Garotinho, estamos disputando
a Presidência, não um concurso para
fiscal de rendas".
Se tivesse que decidir meu voto por
esse quesito apenas, ele seria do candidato que tivesse a franqueza de admitir que não sabe algo sobre um dado assunto.
Seria o mais próximo a um ser humano que chegaria alguém desse
conjunto de personalidades que posam sempre de oniscientes.
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