![]() São Paulo, quarta-feira, 23 de outubro de 2002 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES O Brasil em chamas LUIZA NAGIB ELUF
Nosso país está pegando fogo. Literalmente. Não em relação às
campanhas eleitorais e às acusações entre candidatos de parte a parte, mas em
razão dos incêndios, que estão destruindo a pouca vegetação que nos sobrou da
devastação.
Lugares turísticos em razão das belezas naturais estão perdendo suas características atrativas com o desaparecimento da cobertura vegetal. Não há nenhum recanto do Brasil que possamos considerar preservado da devastação. Diante desse quadro, por incrível que possa parecer, o presidente da República, os governadores dos Estados, os candidatos à Presidência e aos governos estaduais pouco ou nada falam sobre o assunto. Parecem não ver que o estado falencial da economia não é o único fantasma que nos assombra. Os presidenciáveis, em um dos debates que antecederam o primeiro turno das eleições, questionaram-se mutuamente sobre a transposição do rio São Francisco, como se a seca do Nordeste fosse um fato isolado. A seca vai arruinar o país todo, em breve. E não haverá rio São Francisco para ser transposto, porque ele secará em decorrência da devastação das áreas verdes em sua nascente (o Lula foi o único a mencionar esse fato). A pergunta fundamental para os candidatos é: O que será feito para a preservação das áreas verdes, a única coisa da qual o Brasil ainda poderá se orgulhar um dia? O fim da vegetação é também o fim das águas, da produção agrícola e pecuária, do turismo, da saúde; da qualidade de vida; é a miséria mais absoluta. Mesmo assim, a devastação só aumenta, e não é por falha na legislação. É falta de vontade. Durante os últimos anos, o país piorou imensamente nesse aspecto. A questão ambiental, tão vital quanto o controle da inflação, foi sistematicamente esquecida. A pobreza e a ignorância aumentaram demais, todos os morros de todas as cidades, todas as áreas de proteção a mananciais, todos os parques ecológicos estão, de alguma forma, ocupados irregularmente. A cidade de Ouro Preto, considerada pela ONU patrimônio da humanidade, está sendo ameaçada de perder o título em razão da ocupação ilegal e descontrolada de seus morros, o que descaracteriza irrecuperavelmente sua arquitetura. Não há políticas sérias de preservação vegetal, urbana ou rural. A fiscalização ambiental caiu quase a zero. A falta de zelo pelas próprias entranhas dá mais impressão de desgoverno do que a escalada do dólar. Onde estão os responsáveis por essa nau sem rumo? Nossos administradores, que tanto gastam com publicidade, precisariam usar a televisão para reeducar a população e contratar agentes para coibir a destruição. Ou somente sobrará o pó. Luiza Nagib Eluf, 47, é procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo. Foi secretária nacional dos Direitos da Cidadania do Ministério da Justiça (governo Fernando Henrique Cardoso). Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Ives Gandra da Silva Martins e Cid Heraclito de Queiroz: Ajuste fiscal x festival de fundos Próximo Texto: Painel do leitor Índice |
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