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TENDÊNCIAS/DEBATES
A Lei do Abate é uma forma de pena de morte?
SIM
Lula suplanta Bush
WÁLTER FANGANIELLO MAIEROVITCH
Na "war on drugs" (guerra às drogas), o aluno Luiz Inácio Lula da
Silva suplantou o seu professor, George
W. Bush. Em menos de uma semana,
com duas "penadas" irrefletidas e flagrantemente inconstitucionais, nosso
presidente acabou legitimando a pena
de morte no Brasil. Ou seja, regulamentou o tiro de abate de aeronaves, por
suspeita de narcotráfico, e regrou o
afundamento de embarcações tripuladas em mar territorial brasileiro.
Pior, Lula passa a falsa idéia de estar
destruindo meros objetos materiais
quando, na verdade, está a autorizar a
morte de pessoas suspeitas e de tripulantes desavisados, como mulheres,
idosos etc. Quanto aos inocentes tripulantes, usa-se a máxima calhorda de que
os fins (repressão ao narcotráfico) justificam os meios (morte).
Na realidade, tudo não passa de pura
militarização, imoderada e excessiva,
no enfrentamento da questão das drogas ilegais, com execuções sumárias e
decorrentes de suspeita. Nem a lição de
duas tragédias de repercussão internacional, ocorridas em 1997 e 2001, sensibilizou o presidente Lula e o seu secretário nacional de Direitos Humanos.
Em 28 de março de 1997, uma Quinta-Feira Santa, a embarcação albanesa Kater I Rades foi avistada no mar Adriático
pela fragata de guerra Sibilla, da Marinha italiana. A Kater transportava cerca
de 200 imigrantes clandestinos, famintos e miseráveis. O comandante da Kater entendeu em fugir e, ao desviar dos
tiros, afundou a embarcação. Resultado: 108 pessoas mortas, entre homens,
mulheres e crianças. Apenas quatro
corpos foram resgatados.
A outra execução sumária ocorreu no
Peru, em 20 de abril de 2001. Uma base
norte-americana avisou as autoridades
peruanas sobre uma aeronave suspeita
de narcotráfico. Um pequeno avião
Cessna passou, então, a ser perseguido
por dois jatos de guerra, sendo um peruano e o outro, norte-americano. O caça da Força Aérea do Peru acabou derrubando o Cessna a tiros, pois os oito
avisos não foram atendidos: o rádio do
Cessna estava quebrado e os sinais não
foram compreendidos pelo piloto.
O avião abatido não transportava drogas ilícitas, mas um casal norte-americano de missionários metodistas e seus
dois filhos. Na tragédia, morreram a
mãe, Roni Bowers, de 35 anos, e o bebê
Charity, de 7 meses.
A morte de duas cidadãs norte-americanas repercutiu no Congresso e o governo Bush suspendeu o fornecimento
de informações aos países andinos e ao
Brasil. Agora, o país que quiser deverá
comprar informações das empresas privadas de segurança, tipo DynCorp, ou
desenvolver seu próprio sistema de defesa, como o Sivam.
Os grandes traficantes de drogas e os
chefões do tráfico de pessoas não acompanham os pilotos e os navegadores. Esses são "mulas" com brevês ou navegadores "laranjas". O megatraficante Pablo Escobar, por exemplo, nunca viajou
nos aéreos do "Expresso da Cocaína".
Conseguiu, no entanto, comprar e renovar a sua frota de aviões Cessna e Turbo
Commander, com tanques adicionais,
para a "Rota da Farinha", ou melhor, da
Colômbia a Porto Rico, sem escalas.
Antes da tragédia do Peru, o governo
norte-americano, por intermédio do
então presidente Bill Clinton e do secretário Barry McCaffrey, forçou os países
da América Latina a adotarem leis para
a derrubada de aeronaves suspeitas de
servirem ao narcotráfico. Durante anos,
os EUA forneceram informações das
suas bases de Key West, Aruba, Curaçao
e Iquitos. Mais ainda, acompanhavam
os ataques.
Convém observar que os negócios de
compra de aeronaves, hidroaviões e
embarcações são realizados por meio de
financiamentos, com alienação fiduciária em garantia e testas-de-ferro. E não
há fiscalização. No Brasil, a maior parte
das pistas de uso privado para atividades lícitas é clandestina: a Aeronáutica
não autorizou a construção e não fiscaliza o tráfego.
Com efeito, a solução militarizada
aprovada pelo presidente Lula viola direitos e garantias individuais e atenta
contra elementares regras de política
criminal: um avião apreendido é vendido em leilão, financia programas preventivos e operações repressivas. O piloto preso pode virar colaborador da
Justiça. Além disso, o combustível dos
aparelhos termina e, com cooperação e
sinergia, os envolvidos são presos.
Pelo que se nota a carta, subscrita por
Lula, com críticas à linha da guerra às
drogas e endereçada ao secretário-geral
das Nações Unidas, em junho de 1998,
não era para valer.
Pressionado pelo Congresso, depois
da tragédia no Peru, o presidente George W. Bush suspendeu a oferta de informações para os abates e execuções sumários. Já o aluno Lula, mais rígido que
o professor, passou a acreditar que matar é a solução.
Wálter Fanganiello Maierovitch, 57, juiz aposentado do Tribunal de Alçada Criminal de São
Paulo, é presidente do Instituto Brasileiro de
Ciências Criminais Giovanne Falcone. Foi secretário nacional Antidrogas da Presidência da República (1999-2000).
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