São Paulo, quarta-feira, 25 de setembro de 2002

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CLÓVIS ROSSI

Corsários e piranhas

SÃO PAULO - Se você quer entender melhor como funciona a cabeça dos corsários, tratados como agentes do mercado, esqueça um pouco o Brasil. Olhe para a Alemanha.
Lá, a turbulência de anteontem foi atribuída à vitória da social-democracia do primeiro-ministro Gerhard Schröder, que seria um obstáculo às "reformas" que o mercado quer.
Volte agora à genealogia dessa social-democracia: Schröder elegeu-se, em 1998, graças a uma guinada para o centro. Até cunhou um slogan ("Neu Mitte", "Novo Centro") para designar o afastamento da antiga retórica estatizante.
À época, sua eleição não provocou turbulência, porque o "Novo Centro", como a "Terceira Via" de Tony Blair, eram o novo "must" dos fundamentalistas de mercado.
Derrubados os "vermelhos" (o comunismo), desbotava também o cor-de-rosa (símbolo da social-democracia), que servira para entregar anéis ao populacho, para evitar que ele pedisse os dedos.
Schröder até fez algumas reformas, mas os corsários são também piranhas: à primeira gota de sangue que cai no rio, ensandecem e pedem mais, pedem tudo.
É verdade que o estado de bem-estar social alemão contém exageros. Mas o que o mercado quer é jogar fora a criança (o bem-estar) junto com a água do banho (os exageros).
Só assim se explica o fato de que a turbulência foi atribuída à "instabilidade política alemã". É insano. Se há país politicamente estável, é a Alemanha do último meio século.
Volte agora ao Brasil. Grande parte do jogo de alguns agentes de mercado nos últimos meses é parente muito próximo desse comportamento de corsários/piranhas que os agentes de mercado estão adotando em toda parte, com ou sem eleição.
Se aqui se usa o pretexto do "Serra ou o caos", na Alemanha ganhou o Serra teutônico e, ainda assim, a bandeira negra foi hasteada e singrou os mares.


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