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A quem interessa?
ELIANE CANTANHÊDE
Brasília - Era só o que faltava a essa
altura do campeonato: um cadáver.
O assassinato à queima-roupa do líder sem-terra Wenceslau Pereira da
Silva, num assentamento próximo à
fazenda do presidente da República,
acaba sendo um fato político.
E especialmente grave a dez dias de
uma eleição em que o presidente é
candidato, com uma crise financeira
de bom tamanho e bombas a esclarecer nas linhas de Furnas.
É evidente que não se está dizendo
aqui, nem se poderia, que o governo
teria alguma coisa com a história. Pelo contrário. Pode até ser uma vítima.
A questão é saber com clareza o que
está por trás de um crime incomum.
Wenceslau estava numa fila de alistamento de trabalho quando foi algemado e fuzilado na frente de várias
pessoas. Quem o matou queria platéia.
A primeira hipótese é sempre a mais
simples: uma briga pessoal, pelo controle de um sindicato, uma associação, uma mulher.
Não se pode, porém, abandonar outras hipóteses. Principalmente num
crime cheio de símbolos e com algemas, assassinos loiros e barbudos em
pleno centro do Brasil. Gente humilde
costuma resolver essas coisas diretamente. Não contrata capangas.
O problema é que o fato está criado,
e o cadáver existe. Mesmo se confirmada a hipótese de mera briga entre
sem-terra, nada mais, haverá versões.
E versões com viés político.
O governo está na defensiva, mas
ancorado no fato de ter advertido, até
exageradamente, que setores radicais
estariam armando o MST e que poderia haver mortes.
O PT está na ofensiva, mas com a
desvantagem de ficar mais com os
ônus do que com os bônus de uma certa vinculação com o MST.
E há um desvio: o zunzum do envolvimento de policiais hostis ao governo
do DF, onde também haverá eleição.
Nem as bombas de Itaipu conseguiram distrair o país da crise econômica. Resta saber a quantos palmos, e
em quantos dias, vão enterrar o cadáver de Wenceslau.
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