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CLÓVIS ROSSI
Não é ameaça; é despautério
SÃO PAULO - Era previsível que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva
desmentisse a interpretação de que
estava atropelando Legislativo e Judiciário ao perpetrar a seguinte frase:
"Pode ficar certo de que não tem
chuva, não tem geada, não tem terremoto, não tem cara feia, não tem
Congresso Nacional, não tem Poder
Judiciário -só Deus será capaz de
impedir esse país de ocupar o lugar
de destaque que ele nunca deveria ter
deixado de ocupar".
Embora a interpretação de ameaça
fosse perfeitamente cabível, eu prefiro
acreditar no desmentido de Lula.
Bem examinada, a frase não é mesmo uma ameaça. É apenas um despautério -do começo ao fim.
Ponhamos lupa na frase: que diabos tem Deus a ver com o lugar de
destaque do Brasil? Como cristão que
é, Lula deveria saber que Deus é o Pai
de todos, brasileiros inclusive, e quer
o bem de todos os seus filhos.
Aposto que Deus deve estar arrependidíssimo de ser Pai também dos
brasileiros, mas agora é tarde para
voltar atrás. Azar Dele.
Um pouco mais de lupa e verifica-se
que o fim da frase é uma tolice rematada: o Brasil jamais ocupou lugar de
destaque; logo não pode ter deixado
de ocupá-lo, ao contrário do que
imagina o presidente.
Citar o "grande destino" que
aguarda a pátria amada, o "posto de
destaque entre as nações do planeta"
ou muletas retóricas do mesmo calibre é costumeiro em discursos de autoridades. Mas é apenas retórica de
mau orador.
O PT sempre teve, entre seus quadros, jornalistas brilhantes, acadêmicos de primeira linha, autores de textos primorosos. Será que não dá para
contratar um deles para preparar os
discursos de Lula?
Ou, ao menos, pôr no Palácio alguém que tenha a coragem de dizer
ao presidente: "Companheiro, vamos
parar com os despautérios e começar
de fato a governar?".
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