São Paulo, terça-feira, 27 de junho de 2000


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CARLOS HEITOR CONY

Conselho da moça

RIO DE JANEIRO - Custei a identificar o e-mail. Há mais de um ano que nada recebia daquela moça que, durante algum tempo, cismou comigo e me mandava mensagens esquisitas, reclamando de meu pessimismo, de meus adjetivos e, sobretudo, de meu péssimo humor.
Por coincidência, numa reunião em que fui convidado para fazer uma palestra, ela se apresentou, batemos um papo cordial, no dia seguinte a mensagem dela foi amena. Pessoalmente, eu não era tão intragável, elogiou meu bom humor, bem carioca, descambado um pouco para o deboche.
Tudo isso me foi favorável e subi de cotação com a leitora. Subi tanto que ela me abandonou. Deixou de ler o que escrevo, ou achou que não devia gastar boa cera com mau defunto.
Eis que, subitamente, aparece um e-mail, como se fosse de uma velha conhecida, de uma amiga que não se vê há anos. Limitou-se a reclamar da falta de notícias minhas. Que eu desse retorno.
Dei. Mandei-lhe as notícias de que dispunha na ocasião: o assalto ao ônibus na rua Jardim Botânico, a vitória do Flamengo, a subida do Maluf nas pesquisas para prefeito de São Paulo, o título ganho por Guga e a cotação da juta no mercado de Melbourne.
A moça ficou aquilo dentro da roupa -se é que estava de roupa quando abriu a caixa postal dela. Passou-me longa e merecida esculhambação. E, achando que era pouco, investiu contra a toda humanidade acima dos 50 anos de idade, na qual me incluía. Uma cambada de esclerosados, dignos de extermínio.
Segundo ela, o mundo só será melhor no dia em que cada um que chegar aos 50 anos, após as preces e despedidas de praxe, der um tiro nos miolos, deixando o mundo menos poluído e mais solidário.
É uma idéia. Quem sabe, até que uma boa idéia. Não prometo nada, por ora. Mas, se me acontecer alguma coisa de irreparável, a moça ficará sabendo que segui seu conselho.



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