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CLÓVIS ROSSI
Lula mudou-se para a Argentina
SÃO PAULO - O presidente argentino Néstor Carlos Kirchner está sendo
exatamente o que se tinha o direito
de esperar de Luiz Inácio Lula da Silva, se este não tivesse avisado depois
de tomar posse (e só depois) que o
que dizia na oposição era "bravata".
Já mencionei neste espaço que
Kirchner, antes de ser eleito, dizia,
uma e outra vez, que não abandonaria os princípios à porta do palácio de
governo, como tantos fizeram.
Parece incrível, mas não abandonou mesmo, pelo menos até agora.
Em um mês de gestão, Kirchner
conseguiu a proeza de mexer com todos os demônios argentinos: os militares, a Polícia Federal, o FMI e agora os capitais "golondrina" (andorinha), porque aproveitam os juros escandalosos para fazer seu verão.
O fato de ter decidido estabelecer a
obrigatoriedade de os capitais que
buscam a Argentina permanecerem
pelo menos 180 dias no país desafia a
ditadura da ortodoxia, que insiste
em considerar esse tipo de medida
um pecado mortal, digno, portanto,
de excomunhão.
O engraçado é que o controle de capitais está sendo adotado por força
do contundente desmentido que os
fatos colocam a outro dogma ortodoxo, o de que decretar moratória significa que nem mais um centavo
-nem de dinar iraquiano- seria
investido no país que desse o calote.
A Argentina o deu e, não obstante,
está entrando tanto dinheiro que
derruba a cotação do peso e, portanto, atrapalha as exportações, principal motor de uma recuperação econômica ainda frágil.
Não se trata de defender a moratória pela moratória. Se todos (indivíduos, botequins e países) pudessem
pagar em dia suas dívidas, beleza pura. Mas, quando outras prioridades
igualmente inadiáveis são prejudicadas pelo pagamento da dívida nos
termos contratados, não dá para interditar a adoção da moratória ou de
qualquer outra heterodoxia apenas
por ideologia ou por submissão ao interesse dos credores.
O apocalipse, na Argentina, não
veio da heterodoxia, ao contrário do
que dizem os profetas do medo.
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