São Paulo, quarta-feira, 27 de outubro de 2004

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CLÓVIS ROSSI

A volta do bem e do mal

MIAMI - Trocar a disputa Marta x Serra pelo confronto Bush x Kerry dá a estranha sensação de estar mergulhando em um assunto de maior interesse para o brasileiro, exceto, claro, para os paulistanos.
Mesmo assim, a eleição deste ano em São Paulo parece mobilizar menos do que pleitos anteriores -pelo menos se o critério de julgamento for o número de adesivos nos automóveis. São poucos, quase inexistentes. Não que não haja paixão, mas ela parece contida no território dos militantes e interessados diretos de lado a lado. Não muito mais que isso.
Já a eleição norte-americana deste ano parece ter mobilizado o mundo inteiro. É sintomático que tenha sido feita pesquisa para saber em quem votariam cidadãos de um punhado de outros países se tivessem o direito de fazê-lo.
Não consta que tenham sido consultados pernambucanos, baianos, gaúchos, potiguares etc. para saber se votariam em Marta ou em Serra. Não, não estou desmerecendo a eleição paulistana. Apenas constato que, ao peso incomensurável dos Estados Unidos no mundo, somou-se neste ano a sensação -verdadeira ou falsa é o que ainda está por se ver- de que estão em jogo duas visões de mundo tão contrapostas que o resultado é, sim, relevante. Coisa rara hoje em dia.
Na maior parte das eleições desde que o Muro de Berlim caiu sobre a esquerda, a corrida para o centro tornou-se tão desordenada que as únicas diferenças entre os candidatos, na maioria dos casos, acabam sendo de personalidade, não de visões de mundo, país ou cidade.
O paradoxal é que os Estados Unidos é que inventaram a indiferenciação ideológica. Nunca houve uma esquerda de verdade -a ponto de "liberal" ser o apelido que eles dão aos políticos mais à esquerda. Republicanos e democratas diferenciavam-se apenas em matizes quase imperceptíveis a olho nu e à distância. Agora, parecem reinventar as épicas batalhas entre o bem e o mal, e o mundo inteiro é convidado a dizer quem é do bem e quem é do mal.


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