São Paulo, quarta-feira, 27 de outubro de 2004

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FERNANDO RODRIGUES

Discussão fora de foco

BRASÍLIA - O debate sobre a abertura de arquivos públicos tomou um rumo que pode levá-lo ao nada. Tudo parece centrado em documentos ainda não divulgados do período da ditadura militar (1964-1985).
Ao trazer o assunto para o campo verde-oliva, o governo perde sempre. Militares emparedam Lula ao falar em revanchismo. As coisas pioram quando entra o Itamaraty no meio. Um grupo de diplomatas atrasados -perdão pelo pleonasmo- considera desastroso divulgar certas negociações conduzidas pelo país.
Outro equívoco é achar que basta alterar o decreto presidencial de FHC que criou o "sigilo eterno" -documentos vedados por 50 anos renováveis indefinidamente.
Esse decreto tucano é inconstitucional. Qualquer um o derruba na Justiça. A Lei de Arquivos (8.159, de 1991, e ainda em vigor) determina que o prazo máximo de sigilo de um documento público é de 60 anos. Um decreto não pode exceder a lei.
É claro que é bom derrubar o "sigilo eterno" de FHC. Mas o ideal é o Congresso impor ao Poder Executivo federal -e também a governos estaduais e prefeituras- uma política de transparência para todos documentos e informações que produzem.
Toda vez que um prefeito, governador ou ministro ouve esse raciocínio já vai logo falando que o seu endereço na internet traz todas as informações de seu governo. Não é verdade. Nenhum Poder Executivo brasileiro digitaliza tudo o que produz. "Tudo" significa desde os contratos para a licitação da coleta de lixo até os bilhetes internos entre um ministro e o presidente da República.
FHC gravava um diário sobre suas ações na Presidência. Lula tem pessoas que organizam as informações sobre todos os seus encontros. Onde estão essas informações? É até razoável que permaneçam algum tempo em sigilo. Mas até quando? Esse é o verdadeiro debate. O que faz falta ao país é uma lei geral de acesso facilitado a documentos públicos, e não apenas aos arquivos da ditadura.


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