São Paulo, quinta-feira, 29 de janeiro de 2004

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CLÓVIS ROSSI

Pelo telefone

SÃO PAULO - Primeiro foi a expulsão dos mal chamados radicais. Ninguém protestou. Em uma sociedade arquiconservadora como a brasileira, radicalismo é doença. Seus portadores devem ser confinados aos guetos para que não perturbem com sua voz a "coexistência pacífica com a realidade, uma realidade horrenda", para roubar conceito de Moisés Naím, editor da revista "Foreign Policy", aplicável não só ao Brasil mas ao conjunto da América Latina.
Ninguém se deteve a pensar que o contrato entre os "radicais" e seus eleitores e entre eles e o seu partido original, o PT, não incluía votar a favor, por exemplo, da contribuição dos inativos na reforma previdenciária. Prevaleceu o centralismo, não o democrático, mas o stalinista.
Agora é a vez de outra demonstração de desapego a princípios básicos de convivência política e pessoal na forma como foi demitido o ministro da Educação, Cristovam Buarque.
Não é decente dispensar por telefone um companheiro (de partido, de governo, de trabalho), a não ser que tenha cometido um pecado grave. Não tenho elementos para julgar a gestão dele na Educação, mas leio que o pecado de que é acusado Cristovam é o de ser "acadêmico".
Admito que ser acadêmico não é garantia de eficiência na gestão (ou na vida), mas tampouco é uma condenação ao fracasso. Além do que, é melhor ser "acadêmico" do que ignorante, vagabundo ou ladrão.
De novo, desrespeita-se o contrato implícito entre um partido e um de seus quadros. Cristovam Buarque pode não ter sido fundador do PT, mas milita nele há tempo suficiente para ser conhecido. Foi útil para caçar votos para o Senado (como o fora também Heloísa Helena, para não citar os deputados expulsos).
De repente, torna-se descartável, sem ao menos a consideração de uma conversa cara a cara, olho no olho, como o presidente diz gostar de fazer e como havia dito, em Monterrey, que faria. Mentiu. Se mente para os companheiros...


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