São Paulo, terça-feira, 29 de janeiro de 2008

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Números da China

YANN DUZERT


Atrás do êxito econômico, se esconde uma realidade com riscos de implosão: poluição, corrupção, pirataria e desigualdade social


DAQUI A alguns meses, acontecerão os Jogos Olímpicos de Pequim. O Império do Meio se prepara para oferecer o que há de melhor para o resto do mundo. No entanto, atrás de uma história de sucesso incrível em termos econômicos, se esconde uma realidade com sérios riscos de implosão ligados à poluição, à corrupção, à pirataria e à desigualdade social.
A China tem a maior população do mundo, com 1,3 bilhão de habitantes, e possui reservas de 1,33 trilhão de dólares. É o país com a maior produção de televisores do mundo, com 83 milhões de unidades produzidas por ano. É também o segundo país em acesso à internet, com 123 milhões de internautas computados até o final de 2006.
Além disso, é a terceira exportadora de bens do mundo, num total de 765 bilhões de dólares, mas também importa 633 bilhões de dólares. Na área de produção de artigos de informática, também está em terceiro lugar em nível mundial. O PIB já era o quarto do mundo em 2007, com 226 bilhões de dólares, e passou a ser o segundo agora em 2008.
Quanto à geografia, é o maior país em espaço geográfico, com 9,6 milhões de m2. Porém, a China, em termos de perspectiva de vida, está em 116º lugar do mundo, com 72,5 anos. A fecundidade e a natalidade estão em 168º lugar no mundo, com 1,73 criança por mulher, devido à política de filho único.
Para quem ignorava estes números, a China será a primeira produtora agrícola do mundo, a primeira construtora de auto-estradas, de vias ferroviárias, de prédios e de centrais elétricas; também será a primeira em fabricação de computadores portáteis e de televisão; e a primeira produtora e consumidora de carvão e aço.
É também o país que produz 8 em cada 10 tratores do mundo. Uma em cada duas máquinas fotográficas e 7 em cada 10 relógios no mundo são fabricados na China. De acordo com a professora Fabiana Camera, do Programa de Negociações Complexas da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da FGV, a pirataria na China é endêmica.
Segundo relatório da Comissão Européia, 86% das mercadorias piratas apreendidas no ano passado nos países da União Européia eram de origem chinesa. Em 2006, os funcionários da alfândega interceptaram mais de 250 milhões de produtos contra 175 milhões do ano anterior. A maioria eram medicamentos, cigarros e produtos que podem afetar gravemente a saúde dos consumidores.
Outro perigo é a poluição crescente, que põe em risco o próprio crescimento do país. A China está agora na frente dos EUA como o primeiro emissor de CO2 do planeta.
Chuva ácida, desflorestamento, emissão de gases de efeito estufa e rios transformados em esgoto são degradações do meio ambiente que a cada ano causam 750 mil mortes prematuras, de acordo com estimativa do Banco Mundial, e cujas conseqüências podem vir a diminuir o PIB em algo como 8% a 10%.
A desigualdade social é um fator de desestabilização, e a diferença de renda cresce entre as Províncias, as cidades e no campo. Esses fenômenos preocupam muito o regime do poder, mas sua ação fica limitada pela ausência de verdadeiro diálogo social.
Num discurso de abertura do 17º Congresso Nacional do Partido Comunista ao vivo pela TV, o presidente chinês, Hu Jintao, reafirmou a necessidade de o partido continuar no comando das reformas que vêm modernizando o país, mas anunciou uma mudança no padrão de crescimento para os próximos anos capaz de tirar da China o rótulo de nação poluidora, paraíso da pirataria e geradora de desigualdade social.
O presidente prevê o fim do processo de industrialização da China em 2020, quando os chineses terão sua renda per capita quadruplicada, em torno de 8.500 dólares, e quando o atual modelo de crescimento chinês (fortemente dependente de investimentos e exportações, focado na indústria, poluidor, baseado em larga e desqualificada mão-de-obra e no consumo descontrolado de matérias-primas) será substituído por um modelo mais racional, no qual acontecerá a transição da economia dependente de investimentos e exportações para outro, em que o consumo doméstico será igualmente importante.


YANN DUZERT é professor e coordenador acadêmico do "Master in International Management" da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da FGV (Fundação Getulio Vargas).

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


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