São Paulo, segunda-feira, 29 de abril de 2002

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CARLOS HEITOR CONY

A bola pisada

RIO DE JANEIRO - Parece que Lula pisou mesmo na bola. Ao declarar que o imposto de renda deveria chegar a 50% para quem ganha acima de determinada quantia, forma oblíqua de taxar as chamadas grandes fortunas, Lula assustou não o eleitorado, mas o patronato que de alguma forma manobra, manipula ou financia o eleitorado.
Nem se precisa entrar no mérito da questão. Lula expressou, com inesperada ingenuidade, um dos pontos básicos que frequentam todas as reivindicações sociais: quem ganha muito deve pagar muito para o bem de muitos.
O problema é formalizar e operar essa equação simplista que entra pelos olhos de qualquer um. Até certo ponto, esse é o nó que nunca foi desatado em termos de tributação e justiça social. Daí que qualquer candidato que se leve a sério evita meter a mão nessa cumbuca.
Se promete imposto maior para os ricos, agrada aos pobres, que são maioria. Mas desagrada (e como!) os donos do capital, das fontes de produção, daqueles que, embora em minoria, detêm o comando da economia como um todo, e, em especial, dos recursos que darão aos candidatos a possibilidade de se elegerem.
Em todo o caso, a declaração de Lula pareceu sincera. Mas assustou não apenas os demais presidenciáveis, que logo se apressaram a contestá-la, mas ao próprio partido que está se empenhando em mudar a imagem não apenas de seu candidato, mas de sua tática para chegar ao poder.
Simpatizo cordialmente com esses chavões que, afinal, sem frescuras nem complicações técnicas, pretendem corrigir o eixo em que se baseia o Estado e dá à sociedade a garantia de continuar a mesma, com suas distorções e injustiças.
Mas não sou candidato a nada. Posso pensar com a minha cabeça. Ao contrário de Lula, que é obrigado a pensar com a cabeça dos que querem botá-lo no poder.


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