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São Paulo, terça-feira, 29 de abril de 2003

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CLÓVIS ROSSI

Kirchner, o PT de ontem

BUENOS AIRES- Vamos supor que, uma vez na vida, lógica e Argentina se encontrem e, ainda por cima, o façam nas urnas do segundo turno. Se for assim, ganha Néstor Kirchner, o peronista que faz o discurso que o PT fazia até render-se ao terrorismo dos mercados.
Seria uma oportunidade de ouro para que Brasil e Argentina conseguissem, finalmente, levar o entendimento entre seus governos além das juras de amor eterno e das sucessivas crises, de um lado, do outro ou de ambos, que acabaram por jogar o Mercosul para a hibernação.
Daria, por exemplo, para pelo menos tentar discutir a sério a tal reforma da arquitetura do sistema financeiro internacional com o objetivo de reduzir o peso da dívida sobre os respectivos Tesouros.
Kirchner, a esse respeito, leva considerável vantagem sobre Lula: pode dizer o que quiser (sensato ou louco, incendiário ou necessário) sem provocar maiores estragos no risco-país, porque este, no fundo, mede as chances de um país dar o calote. Como a Argentina já deu...
Kirchner tem dito que, para renegociar a dívida argentina, quer um bom desconto e prazo de 50 anos para o repagamento.
Ninguém o internou por isso. Nem o dólar disparou ontem (até caiu), mesmo depois de confirmado que ele estará no segundo turno (contra Carlos Menem, o candidato preferido dos mercados, mas com uma baita rejeição entre os eleitores).
Kirchner adotou um discurso que era o do PT antes. Diz, uma e outra vez, que a eleição argentina significa escolher entre dois modelos, o dele ("da produção, do trabalho e da inclusão") e o de Menem ("da exclusão, da miséria").
É apenas retórica? Pode ser. Quase tudo em política é retórica. Mas, quem sabe se ouvindo música que já tocou, o PT se anime a falar e a fazer mais pela produção, pelo trabalho e pela inclusão.
Afinal, há uma canção política chilena (ou mexicana, não me lembro) que diz: "Juntos, somos mucho más que dos".


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