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MUDANÇA NO IRAQUE
São compreensíveis as razões de segurança que levaram
os norte-americanos a antecipar em
dois dias a transferência da soberania do Iraque ao governo provisório,
mas é inegável que o fato de a cerimônia de entrega do poder ter sido
praticamente secreta -ela só foi
anunciada depois de concluída- dá
um quê de patético ao episódio. A
antecipação poderá reduzir o impacto de uma grande ação terrorista que
estivesse planejada para o dia 30,
mas infelizmente não será capaz de
evitar atentados.
A transferência de soberania é por
certo um passo rumo à normalização do Iraque, mas os desafios diante
do governo interino são de vulto. A
lista de problemas do premiê Iyad
Allawi começa nele mesmo. Depois
de ter rompido com o partido Baath,
o mesmo de Saddam Hussein, nos
anos 70, Allawi passou a viver no exílio, onde acabou tornando-se agente
dos serviços secretos britânico e norte-americano. Essa biografia singular o torna, a um só tempo, desconhecido de boa parte da população e
visto com desconfiança pelos demais. Há os que temem seu passado
baathista e os que desprezam seu
presente de ligação próxima demais
com as forças ocupantes.
Como Allawi não goza de legitimidade popular -ele foi indicado para
o posto e não eleito-, é bastante
plausível que tente ganhar o apoio
das massas iraquianas demonstrando alguma independência em relação a Washington. A questão é que a
principal força de sustentação de seu
governo são os 130 mil soldados
americanos estacionados no Iraque.
Para agravar um pouco mais o quadro, o governo ainda terá de lidar
com os atentados que ocorrem em
ritmo diário, a sabotagem à infra-estrutura e as agruras comuns a toda
nova administração. Isso tudo sem
dispor de forças armadas minimamente eficientes e com dificuldades
para vender seu petróleo.
Não há dúvida de que o governo interino é preferível à administração direta pelos EUA, mas a transferência
de poder não diminui o erro que foi
invadir o Iraque.
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