|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ELIANE CANTANHÊDE
O Lula lá e Lula cá
BRASÍLIA - Em entrevista ao programa "Roda Viva", da TV Cultura, a
senadora Heloísa Helena desceu os
cachorros no governo do PT, foi dúbia quanto à reeleição de Lula e pródiga em elogios ao presidente da Argentina, Néstor Kirchner.
Por quê? Porque ele tem sido mais
Lula lá do que o nosso Lula cá. Um
toma posse na Argentina, o outro, no
Brasil e, no dia seguinte, Kirchner começa a fazer o que os petistas esperavam do governo PT, e Lula, ao contrário, o que os setores financeiros
não esperavam do governo PT.
O Lula lá da Argentina anunciou:
1) controle de capitais estrangeiros,
que só podem sair do país depois de
180 dias; 2) revisão de contratos de
privatização de energia e telefonia; 3)
permissão para extradição de militares acusados de tortura na ditadura.
A esquerda da esquerda adora.
Já o Lula cá do Brasil manteve juros
e superávits primários altíssimos, desautorizou Miro Teixeira (Comunicações) por ameaçar a quebra de
contratos da telefonia e está cheio de
não-me-toques com os militares. Cadê a reforma da Previdência deles? E
os documentos do Araguaia?
A esquerda da esquerda detesta.
Está muito cedo, porém, para
aplaudir a "coragem" de Kirchner
num mundo que precisa de capitais
externos cada vez mais sovinas. Mesmo com toda a cautela de Lula e de
Palocci, os investimentos no Brasil
caíram 63% no primeiro semestre
deste ano em relação a 2002. E na Argentina, o que vai acontecer?
O governo brasileiro, todos sabemos, não está nenhuma maravilha.
Mas daí a dizer que bom mesmo é o
vizinho aprontando das suas vai
uma enorme diferença. Lula cá pode
estar sendo excessivamente cauteloso, mas Kirchner não é o melhor
exemplo. Até porque o Brasil tem lá
seus problemas, mas a Argentina está
simplesmente saindo do zero. Tem
muito pouco a perder. Lula, entretanto, tinha e tem muito a perder.
Kirchner hoje merece os elogios e o
encanto de Heloísa Helena, e Lula só
recebe o tranco. Mas nada como um
dia após o outro. O tempo dirá.
Texto Anterior: Montréal - Clóvis Rossi: Uma certa histeria Próximo Texto: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: O menino Salvyano Índice
|