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São Paulo, terça-feira, 29 de julho de 2003

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ELIANE CANTANHÊDE

O Lula lá e Lula cá

BRASÍLIA - Em entrevista ao programa "Roda Viva", da TV Cultura, a senadora Heloísa Helena desceu os cachorros no governo do PT, foi dúbia quanto à reeleição de Lula e pródiga em elogios ao presidente da Argentina, Néstor Kirchner.
Por quê? Porque ele tem sido mais Lula lá do que o nosso Lula cá. Um toma posse na Argentina, o outro, no Brasil e, no dia seguinte, Kirchner começa a fazer o que os petistas esperavam do governo PT, e Lula, ao contrário, o que os setores financeiros não esperavam do governo PT.
O Lula lá da Argentina anunciou: 1) controle de capitais estrangeiros, que só podem sair do país depois de 180 dias; 2) revisão de contratos de privatização de energia e telefonia; 3) permissão para extradição de militares acusados de tortura na ditadura.
A esquerda da esquerda adora.
Já o Lula cá do Brasil manteve juros e superávits primários altíssimos, desautorizou Miro Teixeira (Comunicações) por ameaçar a quebra de contratos da telefonia e está cheio de não-me-toques com os militares. Cadê a reforma da Previdência deles? E os documentos do Araguaia?
A esquerda da esquerda detesta.
Está muito cedo, porém, para aplaudir a "coragem" de Kirchner num mundo que precisa de capitais externos cada vez mais sovinas. Mesmo com toda a cautela de Lula e de Palocci, os investimentos no Brasil caíram 63% no primeiro semestre deste ano em relação a 2002. E na Argentina, o que vai acontecer?
O governo brasileiro, todos sabemos, não está nenhuma maravilha. Mas daí a dizer que bom mesmo é o vizinho aprontando das suas vai uma enorme diferença. Lula cá pode estar sendo excessivamente cauteloso, mas Kirchner não é o melhor exemplo. Até porque o Brasil tem lá seus problemas, mas a Argentina está simplesmente saindo do zero. Tem muito pouco a perder. Lula, entretanto, tinha e tem muito a perder.
Kirchner hoje merece os elogios e o encanto de Heloísa Helena, e Lula só recebe o tranco. Mas nada como um dia após o outro. O tempo dirá.


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