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TENDÊNCIAS/DEBATES
De volta aos fundamentos
LUIZ PAULO CONDE
A arquitetura brasileira está em
crise. Um sinal eloquente dessa
perda de rumo é a notícia de que a Bienal de Veneza, uma das mais importantes mostras internacionais de arquitetura, que se realizará nos próximos meses,
selecionou 120 projetos de arquitetos de
todo o mundo segundo critérios de qualidade, inovação e representatividade
do estado atual da arte. Pois nenhum
brasileiro entrou na lista.
Apesar disso, lá estarão expostas quatro obras projetadas para o Brasil, todas
assinadas por arquitetos estrangeiros.
Para uma arquitetura que, nos anos 50,
já foi uma das melhores do mundo, é lamentável. Como consolo, poderemos
mostrar alguma coisa na representação
nacional, que ocupará o Pavilhão do
Brasil, projetado por Mindlin em Veneza. Mas a curadoria da mostra foi logo
avisando: "Como vocês não têm tecnologia para mostrar, é melhor trazer trabalhos em favelas ou algumas intervenções na área de meio ambiente".
E assim foi feito, levaremos planos e
projetos nessa linha, inclusive o Favela
Bairro carioca.
Que fazer então? Como podemos recuperar a dignidade da arquitetura brasileira e o prestígio de que já desfrutou?
Em primeiro lugar, fazendo uma profunda autocrítica, e esta começa pelos
fundamentos teóricos da nossa prática.
O Brasil é um país continental, com diversos microclimas tropicais e temperados, vasta diversidade regional e muitas
desigualdades. Não podemos fugir disso. Se tentarmos universalizar uma arquitetura para o país, imitando os americanos, europeus e japoneses com seus
edifícios "high-high-tech", estaremos
fritos. Não temos como competir nessa
área e, quando tentamos, o resultado é
ingênuo ou caricatural.
Isso fica muito evidente na maneira
como abordamos a questão do clima,
da insolação, iluminação e ventilação
das edificações, e até mesmo das nossas
cidades. O apagão do ano passado nos
ensinou muita coisa. Sentimos na carne,
por exemplo, que o problema da economia de energia e da sustentabilidade
não é apenas uma questão acadêmica e
teórica, mas cruelmente prática, atingindo cada um de nós e o cidadão comum no seu dia-a-dia. Será que, depois
desse mico, vamos continuar fazendo
edifícios com fachadas inteiras de vidro,
refrescados por sistemas caríssimos de
ar condicionado? Quem pode pagar essa conta?
Como podemos recuperar a dignidade da arquitetura brasileira
e o prestígio
de que
já desfrutou?
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O que nos alivia é ter certeza de que
sabemos fazer diferente. A arquitetura
moderna brasileira se notabilizou no
exterior, sobretudo entre os anos 40 e
60, trabalhando com brises, marquises,
varandas e alpendres, trabalhando o
controle da luz e da ventilação. Esse modelo não caducou, nem poderia, porque
os fundamentos que o embasaram continuam os mesmos.
Não precisamos "macaquear" ninguém nem "americanalhizar" nossa arquitetura. E é nesse ponto que as universidades precisam se conscientizar do
seu papel e assumir a dianteira desse
movimento de "retorno". Por paradoxal que pareça, às vezes é preciso recuar
para possibilitar o avanço. Em vez de ficarmos copiando os desconstrutivismos e outros "ismos" da moda, que estudemos a obra de Lucio Costa, Niemeyer, Rino Levi, Milan, Jorge Moreira, os
irmãos Roberto, Bolonha, Bratke pai,
Severiano Porto e outros que sabiam tudo sobre o assunto.
E mais, nossa produção urbanística de
qualidade está aí à espera de quem se
disponha a pesquisá-la seriamente.
Também na macroescala, o domínio
desses fundamentos é importante: traçar bairros e cidades em função da topografia, das vistas panorâmicas, das linhas de drenagem, protegendo sempre
as reservas naturais e os mananciais,
orientando-se conforme os ventos dominantes e considerando a insolação no
dimensionamento de logradouros e fixação dos gabaritos.
O urbanismo não pode cair em mãos
de palpiteiros, de políticos inescrupulosos e de interesses exclusivamente comerciais. É ofício técnico que requer estudo e conhecimento. Bons exemplos
não nos faltam. Goiânia, Maringá, Londrina, Campo Grande, Volta Redonda,
Belo Horizonte e Brasília, entre outras
produções autenticamente brasileiras,
são exemplos de uma época em que sabíamos fazer cidades.
Só nos resta retornar aos fundamentos da nossa disciplina.
Luiz Paulo Conde, 68, arquiteto, é secretário-executivo da ONG Vivercidades. Foi prefeito, pelo PFL, do Rio de Janeiro (1997-2000).
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