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São Paulo, domingo, 30 de março de 2003

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GUERRA ESPECULATIVA

A rede de consequências de uma guerra como a que se trava neste momento no Oriente Médio é extensa e intrincada. No palco, por exemplo, das Nações Unidas -que, longe dos refletores, parece perder o foco-, continuam as escaramuças diplomáticas.
Há no entanto um feixe de efeitos desse conflito, bastante abstrato, que se abate sobre a economia. É a guerra especulativa em torno de prazos, efeitos, negócios e expectativas gerados pelo conflito nos mercados financeiros de todo o mundo.
No início da ofensiva anglo-americana, há pouco mais de uma semana, os mercados financeiros esboçaram uma reação eufórica diante do que pareciam sinais de que a invasão seria certeira e a guerra, curta.
Mas o tempo dos mercados financeiros é o do curtíssimo prazo. Mais uns poucos dias de guerra já foram suficientes para gerar dúvidas sobre a eficácia da estratégia norte-americana. Os mercados passaram a exibir trajetórias mais erráticas, a volatilidade aumentou. Não está claro se o conflito vai durar semanas ou meses.
É um cenário perfeito para a especulação. A incerteza aumentou muito e afeta praticamente tudo o que importa na elaboração de cenários, dos preços do petróleo à eclosão de guerras comerciais, passando pela hipótese cada vez mais provável de contra-ataques terroristas numerosos e pulverizados nos próximos meses e anos, seja qual for a duração da operação militar no Iraque.
O Fundo Monetário Internacional deu contribuição oportuna ao jogo das previsões, ressaltando as expectativas de que o mundo entrou num período prolongado de incertezas que podem manter a aversão ao risco em níveis elevados, mesmo com os EUA vitoriosos.
Em seu "Relatório sobre a Estabilidade Financeira Global", publicado na semana que passou, o Fundo coloca em questão as expectativas prevalecentes nos mercados financeiros internacionais. E diz claramente que os ativos financeiros poderão passar ainda por novo ciclo de intensa desvalorização, dificultando a recuperação da economia mundial.
A interpretação do FMI repousa sobre o conceito de confiança. Suas análises mostram que, se a guerra durar mais que o esperado, a confiança se esvai. Mas também deixam claro que, mesmo após a guerra, será enorme o desafio de recuperá-la, em todos os mercados do mundo.
As bases da confiança também estão sendo abaladas estruturalmente pelo crescente desemprego mundial. O alerta vem da OIT (Organização Internacional do Trabalho, ligada à ONU), que aponta para uma perda esperada de até 24 milhões de empregos no mundo devido à guerra no Iraque. O impacto será especialmente severo nos países em desenvolvimento e entre as populações de trabalhadores migrantes.
A especulação no curto prazo, girando em torno da duração da guerra ou dos sucessos cotidianos das tropas anglo-americanas, pode até mesmo gerar bolhas de euforia. O cenário de longo prazo, no entanto, parece a cada dia mais preocupante.


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