São Paulo, terça-feira, 30 de março de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

De alfaces e lavouras

BRASÍLIA - Na campanha eleitoral, Duda Mendonça escolheu a dedo um ator, bom ator, para falar no lançamento da candidatura e na propaganda de Lula na TV como se fosse um genuíno petista.
Não precisava. Se há algo que o PT tem de sobra é a mais aguerrida militância do país. Em vez de ator, Duda e o partido poderiam ter selecionado um militante, bom militante.
Ainda na campanha, Duda arrasou ao filmar Lula passeando entre mesas de uma sala em que quadros técnicos e políticos do PT e de seus aliados simulavam a produção de um superprograma de governo.
Não deveria. Criou a sensação de que Lula assumiria o governo já com projetos prontos e inovadores para educação, saúde, agricultura, trabalho, segurança pública. Uma sensação falsa, como se vê.
Agora, Duda joga na casa de milhões de brasileiros, via TV, uma propaganda sobre o Pronaf (o programa de agricultura familiar) mostrando lindas hortas de alfaces... numa fazenda rica, contratada, que não tem nada a ver com o programa. E com figurantes, em vez de beneficiários.
Será que precisava? A fazenda mostrada é um luxo, mas os sítios do programa governamental devem ser um lixo e os agricultores não estão felizes. Ou seja, a propaganda era falsa. Na verdade, não havia o que mostrar.
Será que Duda deveria? Propagandas comerciais vendem sonhos, situações e pessoas ideais. São vidas alegres, moças e rapazes com emprego, com teto, com comida e sem celulite nem "pneu" na cintura -o que não é o caso da maioria da população. Mas propagandas institucionais de governos devem focar a realidade, prestar contas, informar. A ética da propaganda comercial é uma; a de governos, outra bem diferente.
No mínimo, faltou cuidado ao vender gato por lebre, ou terra seca por alfaces verdinhas, ou lixo por luxo. No máximo, sobrou esperteza.
Com a popularidade despencando, Lula precisa de ação e de um choque de realidade. Esperteza e marketing não vão salvar a lavoura.


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