São Paulo, sábado, 30 de setembro de 2006

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Retrocesso nos EUA

NUMA AFRONTA ao espírito da Constituição dos EUA, o Congresso daquele país aprovou uma nova versão da Lei dos Detentos, conferindo ao presidente o poder de definir quem são os "combatentes inimigos" -aos quais nem todas as proteções previstas nas Convenções de Genebra precisam ser aplicadas- e julgá-los em tribunais militares de exceção. Tais cortes poderão valer-se de provas "secretas" e, em certos casos, de confissões obtidas sob tortura.
O diploma dá ao presidente George W. Bush a prerrogativa de determinar quais técnicas de interrogatório poderão ser usadas. Ficam proibidos apenas métodos que causem danos físicos "sérios" ou psicológicos "permanentes". Emenda que assegurava aos presos o direito de pedir habeas corpus, isto é, de fazer-se ouvir por uma corte regular, foi derrubada pelos legisladores.
Trata-se evidentemente de procedimentos inaceitáveis num Estado de Direito. Afinal, todos os princípios que tornam um sistema judicial civilizado foram aqui ignorados ou pelo menos severamente restringidos.
O mais inquietante, porém, é constatar que o novo pacote de abominações judiciais apresentado por Bush não passa de uma canhestra tentativa de embromar a Suprema Corte, que, em junho deste ano, havia considerado inconstitucionais vários aspectos da primeira versão da Lei Antiterrorismo. O Executivo então reformulou a norma, privando-a de alguns de seus abusos mais acintosos. No essencial, porém, quase tudo foi preservado.
Espera-se que a Suprema Corte volte a apreciar a Lei dos Detentos, agora em sua versão 2006, e mais uma vez a rechace. A grandeza da democracia norte-americana reside justamente no sistema de "checks and balances" (freios e contrapesos) pelo qual um Poder limita eventuais abusos dos demais.


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