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ELIANE CANTANHÊDE
Narrativa própria e apropriada
BRASÍLIA - "A imprensa tem de
discutir o governo, mas não o contrário." A frase é de uma clareza e de
uma importância enormes num
momento em que Lula, ministros,
dirigentes petistas e afins metem o
sarrafo na imprensa publicamente
e, internamente, discutem sabe-se
lá que barbaridades sobre como tratar "esse problema".
Quem a pronunciou, em entrevista à Folha, não é político nem
partidário. É jornalista, doutor em
comunicação pela USP: o presidente da Radiobrás, Eugênio Bucci, que
tenta resistir, corajosamente no
conteúdo e suavemente na forma, a
essa onda antiimprensa.
Entre outras coisas, ele nadou
contra a maré e tentou ensinar aos
colegas de governo que a Radiobrás
é um veículo do Estado para prestar informação aos cidadãos. Não é,
como muitos gostariam, inclusive
outros professores de jornalismo,
um órgão a serviço do governo,
qualquer que seja o governo.
Segundo ele, não cabe à empresa
ser porta-voz nem fazer propaganda desse governo -que, por ser do
PT e se julgar melhor do que todos
os demais do planeta, quer tudo e
todos a seu próprio serviço, desde o
Banco do Brasil, passando pela Petrobras e chegando à Radiobrás.
A fala de Bucci é um rasgo de
bom senso republicano numa costura cada vez mais visível para calar
ou driblar as críticas que a imprensa faz ao atual governo, como fazia
aos anteriores. Pergunte a Sarney, a
Collor, a Itamar, a FHC se eles gostavam. Não. Nem por isso discutiam como impedir ou como usar
dinheiro público para financiar
"órgãos independentes" -aliás, outra ficção desmascarada por Bucci.
Ele mostrou que é possível ser
simpatizante ou membro do PT,
votar há 500 anos em Lula, ter cargo em Brasília e não ser cooptado
por ímpetos autoritários, na base
do "somos melhores do que todo
mundo" e "os fins justificam os
meios". Agora, é esperar.
Será que ele fica? Ou melhor: vão
deixar que fique?
elianec@uol.com.br
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