|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CARLOS HEITOR CONY
À prova de bala
RIO DE JANEIRO Fiquei triste ao ler
nas folhas que o presidente Lula usou
um colete à prova de balas na sua recente ida ao Fórum de Porto Alegre.
Vendo-o nas TVs, estranhei o blusão
rechonchudo que usava, fazendo-o
mais gordo do que é, mas sem estragar o visual, que geralmente é bom e
simpático.
A tristeza é que se há ou houve um
chefe de Estado que não merece a
precaução de um atentado (vaia não
é atentado) é o atual presidente do
Brasil, boníssima alma, apesar dos
erros gramaticais mais primários que
comete cada vez mais, e do erro
maior -este sim, estrutural, danoso
ao país e ao povo que ele diz amar.
No varejo, no operacional, entre
equívocos e acertos, acredito que Lula vai bem, dentro do possível e do cenário maldito que herdou de seu antecessor. Os dois programas sociais
que lançou são duas bobagens. Não
compete ao Estado distribuir comida
aos famintos. As carências que o Brasil sofre não podem ser consideradas
emergenciais, cataclismos eventuais
como o tsunami da Ásia que nos
obriga a mandar remédios, comida e
cobertores para socorrer os sobreviventes.
A principal, para não dizer única
obrigação do Estado, é criar condições estruturais para que não haja fome, desemprego e miséria. Combater
os sintomas é o mesmo que tentar curar um câncer distribuindo ervas de
Santa Maria aos doentes. Pode aliviar a dor, mas não cura o mal. Em
casos extremos, é necessário cortar
fundo.
O atual governo acerta no factual
algumas vezes, mas enquanto adotar
a prioridade econômica que faz um
banco lucrar R$ 3 bilhões ao ano, enquanto privilegia o capital especulativo e não libera verbas aprovadas
pelo Congresso e necessárias para
obras urgentes, merece realmente
vaias mas não atentados na pessoa
do presidente.
Certa vez, nos anos 50, esbarrei com
um homem e sorridente que saía de
um restaurante no centro da cidade,
acompanhado apenas de um amigo,
o poeta Augusto Frederico Schmidt.
Sem segurança, sem colete à prova de
bala. Era JK.
Texto Anterior: Brasília - Igor Gielow: Bush, Iraque e Brasil Próximo Texto: João Sayad: Educação sentimental Índice
|