São Paulo, segunda-feira, 31 de março de 2008

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RUY CASTRO

Um entre 100 mil

RIO DE JANEIRO - Alguns têm quilos de cabelo até hoje. A outros, a calvície emprestou um ar sóbrio e distinto. Óculos desapareceram ou foram incorporados. Cinturas cresceram. Mas estão todos bonitos, principalmente as moças -talvez porque nenhum deles esteja em dívida com o passado.
Quarenta anos depois, eles olham para trás e se orgulham de ter feito a sua parte. O futuro pode não ter sido o de seus sonhos, mas também não foi o que os inimigos pretendiam impor. O mundo mudou nesse período e, em boa parte, por causa deles. Mas coube a eles também mudar, e isso quase sempre significou trocar o impossível pelo possível e que, em qualquer caso, também podia ser muito.
Estou me referindo aos cem participantes da Passeata dos 100 Mil localizados pelo fotógrafo Evandro Teixeira e chamados a posar nas mesmas pedras portuguesas da Cinelândia em que, no dia 26 de junho de 1968, eles se misturavam à multidão captada pelo mesmo Evandro. O balanço que fazem de sua vida consta do recém-lançado "1968 Destinos 2008". É um belo livro. Mas não se limita a um exercício de nostalgia. Ali está a história, com farto material para reflexão.
A foto original de Evandro -um emocionante painel de rostos jovens e confiantes, de frente para a câmera e para a ditadura militar- está num pôster que acompanha o livro. É uma ampliação ideal para que os veteranos da passeata tentem se localizar nela. Mas não é fácil. Os rapazes e moças daquele tempo obedeciam a certos padrões visuais -os mesmos cabelos repartidos à esquerda (eles) ou repuxados para trás e presos com elástico (elas)- que os tornavam parecidos uns com os outros.
Eu, por exemplo, achei vários amigos na foto, mas não me reconheci. Podia ser muitos ali. E, de certa forma, era.


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