São Paulo, sexta-feira, 31 de maio de 2002

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JOSÉ SARNEY

A hora do santo Daime

O candidato Serra, hipocondríaco como eu, promoveu, nesta semana, uma reunião com a classe médica em São Paulo dizendo que "pedido de médico tem capacidade multiplicadora" e apelou para que eles fizessem campanha "entre os pacientes e integrantes de suas equipes, como enfermeiros e auxiliares de enfermagem". Terminou direto: "precisamos de vocês, votem conosco".
Assim, na mesa de operação, o paciente ouve do cirurgião: "Olhe este bisturi, vote no Serra". Ou as enfermeiras e auxiliares, medindo a pressão ou dando injeção, metem a agulha e, "vote no Serra". Eu acho que essa preferência pelos médicos se justifica. A saúde do candidato é prioridade máxima. É difícil aguentar uma pesquisa de baixa sem a pressão subir.
O Brasil também está precisando de médico. As páginas dos jornais desta semana são de dar febre e calafrio. O desemprego alcançou o seu pique mais alto, 8,6%. O Brasil, na década de 80 (quando deixei o governo, em 1990, o índice era de 2,7%), estava no 93º lugar do mundo. Agora, está em 23º, junto da Argentina, que está em 22º. Em números absolutos, somos o segundo país do mundo que conta mais desempregados: 11,454 milhões. O primeiro é a Índia, com 41,344 milhões de desempregados -e um bilhão de habitantes.
Outra notícia má: o PIB caiu 0,73% pelo segundo trimestre consecutivo e, nos últimos doze meses, a queda foi de 0,29%. Recessão "braba". A renda dos trabalhadores está em queda ladeira abaixo. Os juros do cheque especial disparam e chegam a 154,7% ao ano. O gás de cozinha sobe 9%, a produção industrial cai 3,9% e a inadimplência alcança quase 20%. O Tesouro Nacional paga para rolar a dívida os juros mais altos dos últimos tempos -19,10%-, porque o mercado está de orelha em pé. O risco Brasil chega a 999 pontos. Maior do que o nosso, só o da Argentina e o do Peru.
Enquanto isso, a FAB anuncia que seus aviões vão deixar de voar a partir de segunda-feira por falta de combustível. O Exército somente vai funcionar em meio expediente, e a Marinha cancela um dia de trabalho na semana, porque não tem recursos.
O resumo da situação está em artigo de Miriam Leitão: "Os dados divulgados nos últimos dias não deixam dúvidas de que a economia está mal, o PIB negativo, o desemprego crescendo e a renda em queda."
Para aliviar, o talentoso Nizan já tomou vacina: "Serra não é clone de FHC"; a Polícia Federal pediu para liberar a droga do santo Daime, feito do cipó da caiapi, para cerimônias religiosas; e a turma pode, numa viagem celeste, pedir pelo Brasil.


José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.



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