São Paulo, quarta-feira, 31 de julho de 2002

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CLÓVIS ROSSI

Os salteadores e a altivez de pobre

SÃO PAULO - O governo brasileiro está se mostrando pobre até na tentativa de ser altivo ao reagir à catarata de bobagens praticada por esse Paul O'Neill, secretário do Tesouro norte-americano.
A ameaça agora é a de não ser recebido por Fernando Henrique Cardoso se não pedir desculpas. Ora, presidente que é presidente não recebe ministro. Recebe só presidente (ou primeiro-ministro, no caso de regimes parlamentaristas).
Ou alguém já viu George Walker Bush recebendo Pedro Malan, Armínio Fraga ou qualquer outro ministro (brasileiro ou de outro país) ?
Só no Brasil é que o presidente se digna a conversar com funcionário subalterno, desde que, é claro, pertença ao império ou à periferia do império (franceses, alemães etc).
Ainda que O'Neill peça desculpas, estará mentindo, e todo mundo sabe que estará mentindo. Afinal, em fevereiro já havia dito, em sessão do encontro anual do Fórum Econômico Mundial, que os juros brasileiros eram altos por conta da corrupção.
É, portanto, a mesma tese que defendeu domingo apenas formulada semanticamente de outra forma. Pedir desculpas seria hipocrisia.
Que há corrupção no Brasil e que há muita gente graúda que manda dinheiro para a Suíça não resta a menor dúvida (é só olhar a classificação do país no ranking de corrupção da Transparência Internacional).
Mas O'Neill calou-se diante de corrupção muito maior praticada em seu próprio país. O jornal britânico "Financial Times" acaba de mostrar que, nos últimos três anos, os executivos das empresas que faliram nos EUA ganharam US$ 3,3 bilhões enquanto suas empresas iam para o lixo, deixando 100 mil pessoas desempregadas e acionistas na lona.
Para esses salteadores, tudo o que O'Neill dedica é o silêncio. Por tudo isso, se não viesse ao Brasil, apenas preencheria uma lacuna.



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