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Classe C de resultado
Eleitores que elevaram o seu padrão de renda e mudaram de classe no governo Lula misturam Dilma, Tiririca e Russomano na hora de votar; escolha mostra pragmatismo dos emergentes, diz especialista
MARIO CESAR CARVALHO
LAURA CAPRIGLIONE
DE SÃO PAULO
Em 2004, no segundo ano
do governo Lula, o pedreiro
Paulo Sérgio Machado, 34,
diz que passou fome. "Mudei
para Minas atrás de trabalho,
mas deu tudo errado. Minha
mulher chegou a pedir comida na rua", conta com a voz
embargada e os olhos fixos
no chão. Amanhã, se tudo
der certo, ele se muda para
uma casa própria, de 200 m2,
que está finalizando.
Machado e sua mulher,
Núbia, 35, merendeira numa
escola estadual, fazem parte
dos 30 milhões que saíram da
classe DE (com renda de até
R$ 1.520) e passaram para a C
(de R$ 1.521 a R$ 5.100), segundo dados da Fundação
Getúlio Vargas.
Vivem no Jardim São Luís,
distrito da zona sul de São
Paulo que é um dos epicentros da classe C, segundo o
instituto Data Popular. Lá,
entre 2000 e 2010, 55% dos
moradores saltaram para a
classe C. Hoje, quase a metade dos 270 mil moradores são
da classe C.
Paulo, que se diz malufista, foi de Dilma, Netinho (PC
do B) para senador, esqueceu
o número de Marta Suplicy e
votou em branco, Tiririca
(PR) para deputado federal,
cravou na legenda do PT para estadual e Celso Russomano (PP) para governador. Núbia, que se declara simpatizante do PT, repetiu Dilma e
Tiririca, foi de Netinho e
Aloysio Nunes (PSDB) e votou no PT na esfera estadual.
Se você começou a rir da
aparente incoerência, pode
parar, recomenda o publicitário Renato Meirelles, sócio
do Data Popular e especialista no comportamento da
classe C. "A classe C é a mais
pragmática que existe porque sente mais na pele as
mudanças econômicas". O
voto em Tiririca, para ele, revela "uma tentativa de chacoalhar o mundo político".
O Tiririca pelo menos fala
a verdade", diz Núbia, repetindo com outras palavras o
conceito de Meirelles.
O voto em Dilma, segundo
ela, é uma retribuição ao que
aconteceu na vida do casal. O
salário do marido era de R$
300 em 2003 e chegou a R$
3.200 -valor pelo qual assumiu a manutenção de igrejas
evangélicas.
Os ganhos dela mais do
que dobraram nesse período,
segundo ela: de R$ 350 para
R$ 780. Juntos, recebem R$
4.000 para criar três filhos.
Conseguiram juntar R$ 30
mil para comprar uma casa
sem nenhum acabamento
num terreno de 600 m2.
Finalizaram a obra com o
cartão Construcard, da Caixa
Econômica, que financia a
compra de materiais. Gastaram R$ 4.500, que vão pagar
em prestações de R$ 158 por
um período que ela não sabe
quando acaba.
HELIÓPOLIS
Foi o mesmo pragmatismo
que uniu no voto de Dalma
Regia, 29, o tucano Walter
Feldman (candidato a deputado federal) à petista Dilma.
"Dilma, por tudo o que fez o
Lula; e Feldman por ele
apoiar a Companhia de Teatro de Heliópolis. Eu não voto
em partido. Voto na pessoa."
Dalma é atriz da companhia
de teatro.
Heliópolis, zona sul de São
Paulo, com população estimada em cerca de 100.000
habitantes, era ontem território livre para boca de urna.
Na Estrada das Lágrimas,
perto da escola Manuela Lacerda Vergueiro, santinhos
de candidatos eram distribuídos livremente por centenas de cabos eleitorais, diante de policiais militares impassíveis.
Até Cíntia de Souza, que
fazia boca de urna para os tucanos Vaz de Lima e Gilson
Barreto (recebeu R$ 50 pelo
dia de trabalho, sem lanche e
nem transporte), declarava
voto em Dilma.
PARAISÓPOLIS
Mesmo assim, um nordeste desterrado deixou de votar. Lotou, por exemplo, a
quadra da escola Etelvina de
Goes Marcucci, encravada na
favela-bairro de Paraisópolis, zona sul paulistana, vizinha do rico Morumbi.
A quadra do Etelvina era o
local onde cidadãos fora de
seu domicílio eleitoral deveriam se justificar.
Imigrantes de cidades como Campo Maior, Batalha e
Campinas (Piauí), ou Pombal
e Lagoa Nova (Paraíba), ou
Jacobina (Bahia), eram em
sua maioria jovens que em
São Paulo trabalham como
porteiros pintores, pedreiros,
azulejistas, eletricistas, domésticas, cozinheiras, babás, cuidadoras de idosos.
Por volta das 14h30 de ontem, cerca de 400 desses cidadãos espremiam-se na
quadra, preenchendo com
caligrafia hesitante o formulário de justificativa eleitoral,
muitas vezes um ajudando o
outro nos garranchos.
"Em quem o senhor votaria para presidente, se estivesse na sua terra?", perguntou a Folha.
De 58 entrevistados, cinco
não responderam. Os 53 restantes declararam: "Dilma".
A calma nas seções eleitorais -muitas das quais vazias- contrastava com a muvuca reinante na quadra. A
duas horas do encerramento
das votação, os fiscais avaliavam que o Etelvina teria mais
justificativas do que votos.
"Uma quadra de votos perdidos por Dilma", segundo o
cearense Cícero de Assis, 19.
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