São Paulo, sábado, 14 de fevereiro de 2004
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VERTENTES DAS NOSSAS IMAGENS
A fotografia no Brasil na segunda metade do século 20
O portfólio da coleção de Joaquim Paiva mostra em suas primeiras páginas três
orientações que estão na base do desenvolvimento da fotografia brasileira: as
imagens de caráter etnográfico de Pierre
Verger, o grafismo de Thomaz Farkas e o
veio experimental de Geraldo de Barros.
Essas três vertentes vão se consolidar
na produção fotográfica ao longo da segunda metade do século 20, mas já demonstrando sua força nas décadas de 50
e 60 nos trabalhos de Maureen Bisilliat,
que aliam o experimental ao registro antropológico, nas imagens de Walter Firmo, que exploram com cores saturadas a
presença do homem em seu meio, e na
documentação da vida política nacional
de Luis Humberto.
Um rápido olhar pelas páginas de "Visões e Alumbramentos" já é suficiente
para reconhecermos que a documentação e a experimentação se cristalizaram
como os traços mais importantes ou como a vocação da fotografia brasileira,
norteada sempre por um forte cunho estético. Mais uma vez os fotógrafos citados são um bom exemplo, aos quais podemos juntar Orlando Brito na documentação, ao fotografar as botas de um
soldado tendo ao fundo, minimizado, o
Congresso, ou ao modelar com um filete
de luz o perfil de Ulysses Guimarães como se fosse um desenho.
Tivemos já ocasião de constatar essa
tendência na exposição realizada em
maio e junho do ano passado no Centro
Universitário Maria Antônia, que resultou no livro de Rubens Fernandes Junior
"Labirinto e Identidades". Aqui temos as
fotografias de Pierre Verger, que resgatam aspectos da cultura baiana, bem como os trabalhos de José Medeiros com os
índios Xavante. Agora a documentação
cabe a Farkas, ao registrar a construção e
a inauguração de Brasília, enquanto as
fotos de caráter gráfico e também abstrato cabem a Geraldo de Barros, ao construir imagens à base de linhas e volumes
ou ao interferir no objeto fotografado
mediante o desenho.
É interessante lembrar que a tradição
fotográfica brasileira não repousa nas
manifestações da Semana de Arte Moderna de 1922. Os chamados modernistas não deram atenção para a fotografia,
como também não atentaram para o valor artístico do cinema. Durante a Semana, como parte da "revolução", não se
deu nenhuma manifestação fotográfica
ou cinematográfica. É bem verdade que
logo em seguida Mário de Andrade, em
sua viagem pelo Brasil que resultou no
"Turista Aprendiz", recorreu à fotografia
de modo sistemático para registrar a paisagem natural e humana do Nordeste e
Norte, antecipando em algumas décadas
o que viria a se chamar nos anos 1970 der
"antropologia visual" e se constituiu no
alicerce da tradição documental da fotografia brasileira. É também bem verdade
que, logo após a Semana, em maio de
1922, o mesmo Mário escreveu na revista
Klaxon: "A cinematographia é a criação
artística mais representativa de nossa
época". Como diz Rubens Fernandes Junior, "este fragmento mostra a importância do cinema no movimento modernista, mas só como reflexão".
VICTOR KNOLL é professor aposentado do departamento de filosofia da USP. Labirinto e Identidades - Panorama da Fotografia no Brasil (1946-98) Rubens Fernandes Junior Cosac & Naify (Tel. 0/xx/11/3218-1444) 232 págs. R$ 69,00 Visões e Alumbramentos - Fotografia Contemporânea Brasileira na Coleção Joaquim Paiva Joaquim Paiva, Pedro K. Vasquez, Paulo Herkenhoff Brasil Connects (Tel. 0/xx/11/3253-5300) 296 págs. R$ 100,00 Texto Anterior: O humor de Billy Wilder Próximo Texto: A álgebra da revolução Índice |
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