São Paulo, terça-feira, 28 de junho de 2005 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
sociais & cias. ONGs que lidam com temas considerados pouco atraentes, como homossexualidade, prostituição, HIV e hanseníase, têm dificuldade para conseguir patrocinadores Os invisíveis
Luanda Nera
No último dia 30 de maio, a avenida Paulista tomou conta do noticiário de todo o país e atraiu a atenção da mídia internacional
com a realização da 9ª Parada Gay. Os cerca de 2 milhões de
gays, lésbicas, bissexuais, transgêneros e simpatizantes da luta
pelos direitos dos homossexuais fizeram com que, pelo terceiro ano
consecutivo, o evento realizado em São Paulo levasse o título de maior
do mundo. Segundo a Secretaria Estadual de Turismo de São Paulo,
nem o Carnaval, nem as corridas de Fórmula 1 conseguem atrair tantos
turistas à capital paulista. Durante os 30 dias que antecederam o evento,
centenas de atividades foram promovidas em cinemas, casas de espetáculos e centros culturais, todos com visitação recorde.
A crise enfrentada pelos organizadores da Parada Gay é prova de que o apoio da iniciativa privada às causas sociais ainda deixa de fora boa parte dos temas que correm o risco de não serem unanimemente aceitos pela sociedade. O problema atinge até entidades que têm tradição de projetos em determinadas áreas, como é o caso do Gapa (Grupo de Apoio e Prevenção à Aids). Com 20 anos de experiência, o Gapa de São Paulo, uma das 19 filiais da rede no país, é a mais antiga instituição a trabalhar com portadores de HIV na América Latina. Hoje, sua sustentabilidade está vinculada aos recursos vindos do Ministério da Saúde. Segundo o presidente da entidade, José Carlos Veloso, uma crise financeira teve início com o fim das doações de artistas e do financiamento de fundações internacionais, comuns nas décadas de 80 e 90: "As verbas estrangeiras foram direcionadas para as regiões Norte e Nordeste do país, consideradas mais carentes. As empresas privadas ainda têm muito preconceito em apoiar causas ligadas à Aids. Só conseguimos algum tipo de apoio quando as ações envolvem crianças. As empresas querem associar sua imagem a questões beneméritas, como infância e meio ambiente". Preconceito e discriminação fazem parte do cotidiano da ONG Davida. Há 13 anos, a entidade luta pelos direitos das prostitutas. Gabriela Silva Leite, diretora-executiva e fundadora da ONG, também afirma que os investimentos privados se concentram em causas que não representam riscos para a imagem das empresas. É justamente a isso que ela atribui o fato de, até hoje, a entidade não ter conseguido firmar nenhuma parceria com empresas privadas, nem ter vendido nenhum anúncio para o jornal "Beijo da Rua", editado pela entidade, com tiragem mensal de 20 mil exemplares. "Já corremos muito atrás de apoio, mas nunca conseguimos. Muitas vezes, nem uma resposta recebemos. O silêncio é prova do preconceito. Acho que nem passa pela cabeça dos executivos engajar-se em uma causa como a nossa. Não é sedutor e ainda pode gerar repulsa dentro da própria empresa", diz Gabriela. A crítica das entidades marginalizadas pela responsabilidade social empresarial atinge também a mídia. Na opinião de Artur Custódio Moreira de Souza, coordenador nacional do Morhan (Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase), as empresas sentem-se atraídas por projetos e ações que podem lhes trazer retorno de visibilidade, o que está diretamente relacionado a números e estatísticas. "As empresas vão atrás do que é mensurável, do que dá para quantificar, do que pode ser publicado no balanço social. É difícil medir o preconceito. É mais fácil cotar quantas cestas básicas foram doadas, por exemplo", afirma Moreira de Souza. A entidade sobrevive de recursos vindos do poder público e de parcerias firmadas com entidades internacionais do terceiro setor. Desde o final de 2004, no entanto, a Morhan conta com uma parceira entre as empresas privadas. Trata-se da companhia de telefonia celular Claro, que estimula que seus funcionários do programa de voluntariado participem das atividades desenvolvidas pelo Morhan. O diretor de talentos humanos da Claro, Jorge Fornari, argumenta que a estratégia é, justamente, investir em causas que ainda não fazem parte da lista de prioridade das empresas socialmente responsáveis. Texto Anterior: Entrevista: O pai dos rejeitados Próximo Texto: Leituras cruzadas: Cultura e política na história militar Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |