COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM PRAGA

O espetáculo dentro do espetáculo não é nada novo na dramaturgia; Hamlet, de Shakespeare, é um exemplo disso. Mas o teatro Laterna Magika, tipicamente tcheco, talvez a Broadway de Praga, faz desse recurso, há 45 anos, sua principal técnica, o elemento essencial de composição cênica.
Os atores e bailarinos existem duplamente na cena: aparecem num filme, reproduzido sobre o pano que ocupa todo o fundo do palco e arredonda-se até as laterais; e estão no palco, interagindo com as imagens mostradas na tela. Ora contracenam com outros personagens, ora atravessam o pano, surgindo de forma milimetricamente sincronizada na telona, ou o contrário, deslocam-se do cinema para o palco.
No espetáculo Circo Maravilhoso dois palhaços nascem de dois ovos gigantes que flutuam sobre o mar, vêm nadando até o limite da tela, mergulham e submergem imediatamente no palco. O efeito é impressionante, e essa relação perfeita entre atores no palco e atores no filme abre uma possibilidade que o espetáculo explora de forma eficiente: a de trabalhar o limite entre sonho e realidade.
Circo Maravilhoso conta a história de dois palhaços que são guiados em uma viagem por um sedutor charlatão que os apresenta a Vênus. Entre risos obtidos com brincadeiras típicas de palhaços, surge a melancolia de quem descobre que a beleza, mesmo com Vênus ao lado, não é eterna, e que a amargura existe também onde há amor.
Outro espetáculo produzido pela companhia é "Odysseus", que está em cartaz neste mês. A técnica, nesse caso, beneficia a narrativa da epopéia homérica, já que o herói, Odisseu, enfrenta diversos obstáculos durante sua viagem. Assim, o que parecia inimaginável de ser representado em um palco torna-se possível: Odisseu enfrenta o Cíclope, o rei dos ventos e a sedutora e maligna Circe. O efeito obtido não envolve tanto o espectador quanto no Circo Maravilhoso, mas o espetáculo vale pela montagem de cenas que seriam quase impossíveis de serem construídas sem a junção perfeita do cinema com o teatro. (AA)