São Paulo, segunda-feira, 04 de junho de 2001

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FERNANDO GABEIRA
O vazamento de óleo nas piscinas de Barueri

Quando soube do vazamento de óleo num condomínio de Barueri, cheguei a me preparar para a viagem. Aos poucos fui obtendo novas informações: 30 mil litros, situação sob controle. Apenas a imagem, diziam meus interlocutores no local, é impressionante.
Distante mais de mil quilômetros do local, fiquei pensando como seria impressionante a imagem. Pensei em manchas de óleo na grama verde, em piscinas negras como as piscinas de feijoada de "Macunaíma".
Era um condomínio de classe média alta afogando-se na viscosidade da fonte de energia que marcou o século passado e ainda estará presente em nosso cotidiano por alguns anos.
Essa imagem da afluência econômica sendo invadida por manchas de óleo é um pouco a imagem de nossa opção de vida. Para mantermos um alto padrão de vida, o petróleo foi e ainda é um elemento decisivo em nossa escolha.
Em muitos países onde é usado também para produzir energia elétrica, o petróleo se confunde com a própria discussão da crise energética. Aqui no Brasil, onde o usamos mais para garantir nossa mobilidade, em carros ou veículos pesados, ela não se confunde tanto com a energia que move nossas casas ou fábricas.
Mesmo assim, os sucessivos desastres ecológicos acontecidos no país, inclusive o afundamento da plataforma P-36, chamaram a atenção para o preço que pagamos por usar e abusar do petróleo, um dos grandes poluidores dos mares do planeta.
O óleo que invadiu o condomínio em Barueri é um mensageiro da crise ecológica em que estamos mergulhando. Falta energia elétrica, e o petróleo que garante nossa mobilidade, ele mesmo, se move desordenadamente nos dutos e oceanos.
Estamos recebendo aviso atrás de aviso. No princípio, era coisa de veadinho. Depois, surgiu a expressão "ecochato" para estigmatizar os iniciantes que se empolgavam com o tema e exageravam nas previsões.
Esses moradores de Barueri, apesar de confortavelmente instalados, certamente serão forçados a pensar na precariedade do mundo que construímos. Assim como os brasileiros, mergulhados na crise energética, serão forçados a pensar em termos outrora obscuros e tediosos: eficiência energética, conservação.
Como país no conjunto, repito apenas o texto que li no livro de Joschka Fischer, chanceler da Alemanha: "As nações vencedoras no século 21 serão as que forem capazes de "ecologizar" a sociedade e a economia".
Mostrei esse texto para um amigo e ele disse: isso é papo de verde alemão. Esse amigo, quando discutimos, me lembra um bangue-bangue em que o mexicano amarrava um caubói e perguntava a ele: "Gringo, terei de matá-lo para provar que gosto de você?"
As crises ecológicas têm esse sentido. Elas avisam e dão uma chance. Mas chega um momento em que virá só aviso porque a chance já terá sido perdida no tempo e as técnicas de contenção do processo destruidor perderão sua eficácia.
Dentro dessa lógica, pode-se até dizer que felizes foram os nadadores das piscinas de Barueri. Algumas braçadas no óleo valem como uma espécie de aparição da Virgem para os que buscam o reino dos céus.



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