São Paulo, quinta-feira, 07 de fevereiro de 2008

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LETÔNIA, LITUÂNIA, ESTÔNIA

Aos 66, filha de estonianos foi ao país que conhecia de histórias

Invasões soviéticas e falta de emprego permeiam a memória de estonianos, letões e lituanos no Brasil

PRISCILA PASTRE-ROSSI
DA REPORTAGEM LOCAL

Eles viajaram mais de 15 mil quilômetros para se conhecer. Estonianos, os pais de Erna Liddik Koosberg, 77, se viram pela primeira vez no Brasil. Em três meses estavam casados.
Ele, que morava em Omsk, na Rússia, e ela, que vivia em Tartu, na Estônia, saíram da Europa pelo mesmo motivo: falta de emprego. "Eles nunca deixaram de amar a Estônia, mas diziam que a terra deles era o Brasil, onde vieram em busca de oportunidades -e as encontraram", conta.
Dona Erna conheceu a terra dos pais aos 66 anos. "Acho impressionante o fato de a capital ser metade medieval e metade moderna. Fui duas vezes. E gostaria de voltar mais vezes."
Na infância, ela imaginava o lugar através das histórias contadas pela mãe. A que mais ouvia é sobre a origem do lago Linda Järv, em Tallinn, perto do porto. Segundo um conto popular, o "lago da Linda", como a mãe o chamava, surgiu de um coração partido. "Foi quando uma moça, abandonada por seu amor, chorou de saudade por tanto, mas por tanto tempo, que acabou dando origem a um lago", reproduz.
Como os pais nunca deixaram de conversar em estoniano, e a mãe praticamente só preparava os pratos de seu país, dona Erna fala e lê fluentemente o idioma e, na cozinha, capricha nas receitas estonianas.
"Lá as pessoas comem muita batata, peixe e carne de porco, já que a carne bovina não é tão comum", diz. Há poucos pastos no país por causa do frio -no inverno, chega a fazer 30C negativos. "Fica muito caro manter o gado no estábulo, que precisa ser aquecido com tubos de água subterrâneos para os animais não morrerem de frio."
Uma especialidade de dona Erna é o chouriço, embutido de sangue de porco, cevada, cebola e temperos, que ela prepara no Natal. "Encho as tripas e levo ao forno. Uma delícia comer com bacon e geléia de ameixa."
Para recordar a infância, faz a lurka, uma sopa doce. "Misturo uva, damasco, maçã e pêra. Cozinho até que engrosse, como uma compota. Depois, é só adoçar, esperar esfriar e comer."
Nascida em São Paulo, um dos passatempos preferidos de dona Erna na infância era ver os pais se enrolarem no português. "Uma vez, na feira, meu pai pediu arroz ao vendedor. O moço colocou um bom tanto, e meu pai dizia: "mais, mais!". O rapaz continuou colocando arroz. O problema é que, em estoniano, pronuncia-se "mais" para "milho". Ele queria milho, mas acabou levando foi um bocado de arroz, mesmo", diverte-se.

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