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São Paulo, segunda-feira, 14 de abril de 2003

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AVIAÇÃO

Apesar da crise no setor, brasileiro que preside a companhia européia vê caminho de duas vias entre Portugal e o país

TAP peita turbulência com 30 vôos ao Brasil

SILVIO CIOFFI
EDITOR DE TURISMO

O gaúcho Fernando Pinto, 53, entende de turbulências. Presidente da companhia aérea TAP-Air Portugal desde 2001, ele está conseguindo driblar a crise que acomete o setor, já que a empresa, uma estatal que fechou o ano de 2000 com um resultado negativo de 62 milhões, exibiu balanços com lucros operacionais por dois anos consecutivos. Primeiro brasileiro a voar num ultraleve, o executivo trabalhou 28 anos na Varig, empresa que também presidiu. Leia a seguir suas impressões sobre o futuro da aviação internacional e a viabilidade da anunciada fusão entre a Varig e a TAM.

EQUILÍBRIO - "Quando cheguei a Portugal, no ano 2000, a TAP contabilizava prejuízos líquidos de 120 milhões, com uma perda operacional de 62 milhões. Iniciamos um programa de ajustes forte, deixando os prejuízos no patamar de 20 milhões e realizando um ganho operacional de 20 milhões. Em 2002, ano em que transportamos 5,5 milhões de passageiros (3,3% mais que em 2001), fechamos o ano com uma perda líquida de 6 milhões e um ganho operacional de 50 milhões. Isso dá para medir o perfil de recuperação da empresa, que diminuiu seu endividamento. A TAP tem 57 anos, e a cultura na Europa é fortemente sindicalizada. Aprendemos a trabalhar com os sindicatos, que entenderam as dificuldades e colaboraram."

ESTRATÉGIA - "A TAP tem hoje vôos diários diretos para São Paulo, Rio e Recife, quatro semanais para Fortaleza e cinco para Salvador; são 30 vôos por semana só para o Brasil, voando com equipamentos Airbus; A-340 para os três primeiros destinos e A-310 para o Nordeste. A ocupação nas rotas já esteve melhor, mas ainda é boa, na faixa de 75%. Há um caminho de duas vias sendo trilhado entre Brasil e Portugal. Havia vôos da TAP e, então, hoteleiros portugueses passaram a investir mais no Brasil, o que por sua vez ajuda a companhia."

GUERRA - "Minha análise é que a guerra no Iraque e as dificuldades econômicas internacionais não ajudarão o Brasil a ter mais turistas -aliás, a guerra não ajuda país nenhum. Mas é claro que Brasil e Portugal terão menos perdas que outros países mais envolvidos no conflito. Em termos globais, as empresas americanas sofreram muito, seja no âmbito interno, seja no mercado externo. Seja no Atlântico Norte, seja no Pacífico, a crise é uma realidade. As empresas aéreas européias sofreram menos, mas também enfrentaram queda de mercado. A companhia ainda estava em fase de consolidação de algumas rotas, ocupando espaços, pois havia rotas que podiam ter dois vôos diários -e a empresa não tinha. Isso permitiu um crescimento de 8% na oferta de vôos, que a demanda acompanhou."

PRIVATIZAÇÃO E ROTAS - "Temos 37 aviões, 27 são Airbus da família A-320, A-321 e A-319. Também temos A-310 e A-340. A TAP é uma empresa estatal, mas está sendo preparada para a privatização. Temos 8.200 funcionários, mas é preciso levar em consideração que 50% do trabalho que fazemos de manutenção é para terceiros, como Air France, Lufthansa e empresas do Oriente Médio. Nas rotas intercontinentais, o Brasil é muito importante, rivaliza em importância econômica para a empresa com países da África, como Angola, Moçambique e África do Sul. Há também Dacar, no Senegal. Nosso maior movimento é dentro da Europa -caso de Paris, com sete vôos diários; de Madri, com seis ou sete vôos por dia; de Londres, com uns quatro vôos todo dia. Para a Itália, entre Roma e Milão, fazemos cerca de quatro vôos diários. Depois vem Bruxelas, com número parecido. Outra particularidade são os vôos para a ilha da Madeira, para onde voamos quase em regime de ponte-aérea; idem para os Açores. Para os EUA, temos algo como sete ou oito vôos semanais. Com relação às alianças globais, temos acordos com empresas européias em separado, caso da Iberia, da Portugália, da FinAir e da British Midland, mas não participamos ainda de nenhuma aliança. A estratégia é revigorar e fortalecer a empresa -para, então, negociar."

ULTRALEVE - "Quando eu trabalhava na manutenção da Varig, fui convidado por um grupo de amigos que havia levado o primeiro ultraleve para o Brasil. Era um equipamento antigo, parecido até com o Demoiselle inventado por Santos Dumont, um ultraleve de primeira geração. E aí fomos, no Rio, ao Campo dos Afonsos para fazê-lo voar. Fizemos várias corridas na pista, mas estava difícil fazer a decolagem. Subíamos um metro, não mais que isso. Como eu era o mais magrinho, consegui, afinal, fazer o ultraleve subir -e como festejei quando passei ao lado da torre de controle! Isso foi em 1981."

MEMÓRIA - "Trabalhei 28 anos na Varig, de 1972/1973 a 2000. Sem dúvida fui influenciado por meu pai [Fernando Pinto é filho de Lili de Souza Pinto, piloto que marcou época na aviação brasileira e que, diz uma história não confirmada, teria levado Leonel Brizola para fora do Brasil depois da malograda resistência ao movimento militar, em 1964". Ele era um profissional de empresa aérea e uma pessoa entusiasmada pela aviação, levava a segurança de vôo e o treinamento a sério, idem a organização da companhia. Gostava do que fazia -e isso foi contagiante. Estava disponível a qualquer instante para fazer o vôo que a empresa precisasse: podia estar no meio de um churrasco, mas largava tudo para atender a um chamado. Meu irmão virou piloto, é um dos mais antigos na Varig, voa no Boeing-777. Acabei também me tornando engenheiro mecânico pela UFRJ e piloto de avião privado."

BRASIL - "Tenho boas recordações da minha vida profissional, passei na Varig um período muito importante da vida, tenho família lá, uma ligação e um carinho pela empresa. Aquilo foi uma escola. Com relação à fusão da Varig e da TAM, acho que ela é possível, pode ser uma ferramenta num momento de mercado difícil. É claro que as culturas das empresas são diferentes e que isso é um desafio. Mas a fusão é possível, as frotas são diferentes, a TAM está mais ancorada nos jatos da Airbus, a Varig tem uma frota de Boeings, mas progressivamente as empresas podem aprofundar esses laços. Ouvi o discurso dos cem dias do presidente Lula no rádio e acho que há um ar de "positivismo" no país, e as razões para que isso ocorra são reais."

EUA - "Esse foi sem dúvida o mercado que mais sofreu. Gigantes como United Airlines e USAir enfrentaram uma perda de 20% no número de passageiros. Houve ainda uma queda de preços, pois a competição lá é forte, o que fez com que a oferta se ajustasse, mas aos poucos. A American Airlines conseguiu resistir, mas a conjuntura ainda não é fácil. Há ainda as empresas "low cost, low fare" [custos baixos, tarifa baixa" trilhando caminhos diferentes. A filosofia inova, mas atende determinados mercados, não pode atuar numa escala grande de distribuição."


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