São Paulo, quinta-feira, 19 de junho de 2008

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"IN AND OUT"

Associada ao "estilo internacional", cidade demorou para se abrir à arquitetura contemporânea de autor

Com sua geometria democrática, NY se impõe pelo conjunto

GUILHERME WISNIK
ESPECIAL PARA A FOLHA

Por trás dos arranha-céus de Manhattan pulsa uma energia lúdica, fantástica e artificial, herdada dos grandes parques de diversão de Coney Island, que fizeram sucesso no raiar do século 20. Essa é a tese do arquiteto holandês Rem Koolhaas, no livro "Nova York Delirante", lançado no Brasil neste ano pelo Cosac Naify.
Tendo crescido sem o impulso de manifestos ou experimentalismos de vanguarda, a cidade foi construída pelo "puro mercado", diz Koolhaas, daí a sua vitalidade.
No entanto, engana-se quem espera encontrar, no coração do capitalismo, uma metrópole desenhada pelo caótico "laissez-faire" da iniciativa privada.
Pois se a pressão da especulação imobiliária empurra a cidade infinitamente para cima, na figura do arranha-céu, é porque, no nível do solo, o seu desenho está perfeitamente regulado em favor da coletividade, com um traçado regular de ruas e um parque soberano no miolo da ilha: o Central Park.
A propósito, como bem disse o semiólogo francês Roland Barthes, a geometria nova-iorquina é democrática. Ela serve para que cada um se sinta, poeticamente, "proprietário da capital do mundo".
Caminhando pelas quadras entre a Lexington, a Madison e a Park Avenue, no Midtown, podemos atravessar vários térreos públicos de edifícios privados, cruzando-os por dentro.
Por ali, encontramos também o belíssimo edifício Lever (1952), de Gordon Bunshaft, o modelo do nosso Conjunto Nacional , e o Seagram (1958), de Mies van der Rohe: o original "grego" diante do qual todos os outros prédios modernos não passam de imperfeitas réplicas romanas. É uma jóia discreta.

Conjunto
Nova York, no entanto, nunca foi um mostruário de pérolas arquitetônicas excepcionais, e sim uma cidade que se impõe pelo conjunto. Isto é, por sua urbanidade opulenta e sem afetação, cuja força de eficiência e impessoalidade ficou associada ao chamado "estilo internacional" em arquitetura. Com uma honrosa exceção: o museu Solomon R. Guggenheim (1959), de Frank Lloyd Wright.
Demorou para que a cidade se abrisse mais amplamente para a arquitetura contemporânea de autor, que começa a povoar hoje os centros de arte e moda de Manhattan: o SoHo e o Chelsea. Assim, desde o começo do milênio, arquitetos como Rem Koolhaas (Loja Prada, 2001), Norman Foster (Hearst Tower, 2006), Frank O. Gehry (sede da InterActiveCorp, 2008), e a dupla japonesa Sanaa (New Museum, 2008), têm criado edifícios que vêm rivalizar com os resistentes símbolos da cidade, ainda ecléticos e art déco (o Flatiron, 1902, o Chrysler, 1930, e o Empire State, 1931). E no distrito financeiro de Wall Street, em substituição às anônimas Torres Gêmeas do World Trade Center (1973), de Minoru Yamasaki, o espanhol Santiago Calatrava erguerá sua arquitetura musculosa e expressionista.
No raiar do chamado "século chinês", não sabemos se a capital do século 20 continuará a afirmar o espetáculo da cidade, ou se capitulará à sedução fácil da "arquitetura espetacular".


GUILHERME WISNIK, 35, é arquiteto e autor de "Lucio Costa" (ed. Cosac Naify, 2001)


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